
Imagine a cena: um senhor de 72 anos, visivelmente fragilizado, sentado sozinho num campo de futebol poeirento de Caucaia. No braço, ainda preso pela pele aderente, um cateter intravenoso — a prova viva de que algo terrivelmente errado havia acontecido. Esta não é ficção, mas a realidade brutal que a família de Francisco* viveu na última quarta-feira.
Segundo relatos dos familiares — ainda atordoados com a situação — o idoso havia sido internado no Hospital Municipal de Caucaia para tratamento de uma pneumonia. Teve alta médica naquela manhã, mas aqui começa o absurdo: liberado sem condições mínimas de locomoção e, pasmem, ainda com o acesso venoso no braço.
O desfecho inacreditável
Em vez de ser entregue aos cuidados da família ou, no mínimo, ter sua saída assistida, o senhor foi simplesmente deixado num campo esportivo próximo à unidade de saúde. Sozinho. Desorientado. Com um dispositivo médico que exigia cuidados específicos para ser removido.
"É de cortar o coração", desabafa uma das filhas, que preferiu não se identificar. "Meu pai não estava em condições de nem andar direito. Como alguém em sã consciência acha que soltar um idoso frágil num descampado é procedimento padrão?"
A resposta (ou falta dela) das autoridades
Procurada, a Secretaria Municipal de Saúde de Caucaia limitou-se a dizer que "apura os fatos" — aquela velha fórmula burocrática que todos conhecemos. Enquanto isso, a família espera. E sofre.
O Conselho Regional de Medicina do Ceará já foi notificado e deve abrir procedimento para investigar possíveis violações éticas. Afinal, estamos falando de negligência grosseira, algo que fere não apenas a dignidade humana, mas os protocolos mais básicos de assistência pós-alta.
Não é isolado
O pior? Todo mundo sabe que casos assim não são raros. O sistema público de saúde — sobrecarregado, subfinanciado, muitas vezes desestruturado — frequentemente falha com os mais vulneráveis. Mas deixar um paciente idoso num campo de futebol? Isso atinge um novo patamar de desumanidade.
Francisco está agora em casa, sob os cuidados da família. O acesso venoso foi finalmente removido, mas a marca no braço é só a mais visível das feridas. A psicológica, essa, vai demorar muito mais para cicatrizar.
*Nome alterado para preservar a identidade do paciente.