
O silêncio na Rua 9, no bairro Jardim dos Eucaliptos, era pesado — quase palpável. Nesta terça-feira (26), agentes da Polícia Civil encenaram, minuto a minuto, os últimos passos de Kaylane Campos, a adolescente trans de 16 anos cuja morte ainda ecoa como um mistério doloroso em Ilha Solteira.
E não foi um reconstituição qualquer. A cena foi montada fielmente à narrativa do único suspeito do caso: o próprio namorado da vítima, um jovem de 17 anos que alega ter sido um acidente doméstico. Sim, você leu certo. Acidente.
Segundo ele, tudo não passou de uma brincadeira que deu errado. Uma simulação de enforcamento que, de repente, se tornou real. Mas será mesmo? A polícia não parece totalmente convencida — e a comunidade, menos ainda.
Os minutos que abalaram uma cidade
A reconstituição começou por volta das 15h, com o jovem presenciando cada movimento. Ele repetiu gestos, mostrou posições, reviu sua própria fala. Tudo sob o olhar atento do delegado Marcelo Máximo, da Delegacia de Investigações Gerais (DIG), que comanda as apurações.
Kaylane não estava sozinha naquela tarde. A irmã mais nova, de apenas 11 anos, também estava em casa. E teria visto tudo. Detalhe: a família da jovem não acredita na versão do rapaz. Está tudo muito… estranho. Incompleto.
“A gente quer justiça. Quer saber o que realmente aconteceu com nossa filha”, desabafou uma parente, que preferiu não se identificar. A dor, essa, não tem nome.
O que não fecha na história
Vamos combinar: uma simulação de enforcamento que termina em morte? Soa mais como roteiro de série policial do que como fato real. E as marcas no pescoço de Kaylane? E o suposto pânico do namorado, que em vez de chamar ajuda correu para avisar a avó da vítima? Alguém aí também estranhou?
O laudo preliminar do IML já adiantou: causa da morte, asfixia. Mas o como — e o porquê — ainda são cheios de interrogações.
A polícia está cautelosa. Muito. “Estamos apurando todas as hipóteses”, disse o delegado, evitando criar alarme ou especulações prematuras. Mas a pressão por respostas só aumenta.
Além do crime: a vida de Kaylane
Ela era estudante. Adolescente. Tinha sonhos — interrompidos de forma abrupta e cruel. Sua identidade trans também levanta discussões importantes sobre violência contra a comunidade LGBTQIA+, ainda que as motivações do crime permaneçam incógnitas.
Ilha Solteira é uma daquelas cidades onde todo mundo se conhece. E quando uma tragédia assim acontece, é como se um raio cortasse o céu azul. A comoção é coletiva. A dúvida, também.
O caso agora segue sob sigilo. O adolescente relatou ter ficado em choque após o ocorrido. Mas a justiça exige fatos — e a verdade, ainda que dura, precisa vir à tona.
Enquanto isso, uma família chora. Uma cidade se pergunta. E a polícia tenta juntar as peças de um quebra-cabeça que, até agora, não faz sentido algum.