
Era pouco depois do amanhecer quando um grupo determinado cruzou os portões do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em Aracaju. Nem o vento úmido típico de julho em Sergipe — daqueles que grudam na pele — desanimou os manifestantes.
"Chega de promessas vazias", gritava uma mulher de chapéu de palha, enquanto erguia uma bandeira vermelha que mais parecia um raio contra o céu nublado. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) não veio para pedir: veio para cobrar.
O que está em jogo?
No centro da briga, aquilo que todo pequeno agricultor conhece na pele:
- Demora crônica na desapropriação de terras improdutivas
- Falta de crédito agrícola a juros decentes
- E um detalhe que dói: burocracia que engole até as esperanças mais teimosas
"A gente planta, mas quem colhe são os bancos", disparou um senhor de mãos calejadas, enquanto ajustava o boné surrado. A fala dele ecoou entre os presentes como um verso de repente numa feira livre.
Do discurso à ação
Dentro do prédio público — que agora cheira a café forte e suor de gente cansada de esperar —, cartazes caseiros cobriam as paredes. Alguns até mal colados, com fita grudenta já descolando nas pontas. Mas a mensagem? Cristalina.
E olha que o INCRA em Sergipe não é exatamente um paraíso burocrático. Dizem por aí que os processos andam mais devagar que carroça em ladeira de barro depois da chuva. Só que desta vez, os sem-terra prometem ficar "até a última página do último processo ser lida".
Enquanto isso, do lado de fora, um carro de som tocava músicas de protesto que misturavam Luiz Gonzaga com rap de guerrilha. Parecia estranho? Talvez. Mas era aquele tipo de estranheza que faz sentido quando a paciência já virou pó.
O que dizem os números
Sergipe tem:
- Mais de 30 áreas identificadas como prioritárias para reforma agrária
- Apenas 7 processos de desapropriação concluídos nos últimos 3 anos
- Famílias acampadas há mais tempo que muita criança tem de vida
"Isso aqui não é ocupação, é resistência", corrigiu uma jovem que, aos 22 anos, já conhece mais leis agrárias que muitos advogados. Ela segurava um caderno surrado cheio de anotações — a "Bíblia" do grupo, como brincaram.
O clima? Tenso, mas não explosivo. Até porque, como me disseram entre um gole de café amargo e outro: "A gente não briga com servidor, a gente briga com sistema".