
O ar em São Paulo estava pesado naquela sexta-feira, mas não era só por causa da poluição. Algo fervia nos corredores do The Town, e não era apenas a expectativa pelos shows. Supla, esse ícone do rock brasileiro que nunca teve papas na língua, soltou o verbo em uma conversa que mais parecia um manifesto.
"O pessoal acha que protestar com bloqueio é fazer revolução?" questiona ele, com aquela voz rouca que a gente conhece de décadas de palco. "Tá brincando comigo? Isso aí é só um convite para a confusão, para a baderna pura."
E não para por aí. O músico, sempre à vontade para polêmicas, defende uma tese que vai fazer muita gente coçar a cabeça: a verdadeira transformação social não vem do caos, mas da cultura. Da arte. Da música, veja bem.
O Palco Como Trincheira
Supla acredita, com uma convicção que quase dá para tocar, que um festival como The Town é justamente o espaço onde a mudança de verdade pode acontecer. Imagine só: milhares de pessoas, unidas pelo mesmo ritmo, pela mesma emoção. Isso sim é poder.
"O palco é a nossa trincheira", ele dispara, sem hesitar. "É dali que a gente consegue falar com todo mundo, cutucar as consciências, fazer as pessoas pensarem. Bloquear via, atrapalhar a vida dos outros? Isso é pequeno perto do que um acorde bem dado pode fazer."
O Efeito Dominó da Arte
O raciocínio do artista é fascinante. Ele enxerga a cultura como uma pedra jogada num lago — o impacto inicial é local, mas os círculos se espalham, alcançam lugares impensáveis. Uma letra, um refrão, um solo de guitarra podem ecoar na mente das pessoas por dias, semanas, anos.
"A gente tem é que ocupar esses espaços de alegria, não estragá-los", reflete. "Porque é na alegria, no compartilhar, que as ideias novas germinam. O protesto violento? Só gera medo e raiva. E medo e raiva são terrenos férteis para coisa nenhuma de bom."
Ele fala com a experiência de quem já viu de tudo nessa vida. De palcos vazios a estádios lotados. De vaias a aplausos estrondosos. E talvez seja essa vivência toda que dá um peso especial às suas palavras.
Um Chamado Para a União
No fundo, o que Supla propõe é uma revolução do jeito mais difícil — e mais eficaz. Ao invés de confronto, conexão. No lugar do grito de guerra, uma melodia. É quase poético, se não fosse tão prático.
"Olha só", ele diz, baixando o tom como se contasse um segredo. "Quando você está lá, no meio da multidão, e a música simplesmente te toma... Não importa se é rico, pobre, de esquerda, de direita. Naquele instante, todo mundo é igual. Todo mundo sente a mesma coisa. E é essa emoção compartilhada que quebra barreiras."
E talvez ele tenha um ponto. Quem nunca se arrepiou com uma música junto com estranhos? Quem nunca sentiu que, por alguns minutos, pertencia a algo maior?
O recado do roqueiro é claro: não subestimem o poder de um bom festival. A próxima grande mudança social pode muito well começar não num protesto na rua, mas num coro cantado por milhares de vozes, em perfeita sintonia.