
Não é de hoje que os traços afiados de J.Caesar cortam como navalha pelas entranhas da nossa política. Dessa vez, o cartunista — com aquela mistura de sagacidade e deboche que só ele domina — espetou o dedo na ferida mais uma vez. E como dói.
Publicada nesta sexta (21), a charge parece até premonitória. Num cenário onde o Congresso mais parece um circo de horrores — com palhaços que não nos fazem rir —, Caesar capturou o absurdo cotidiano com a precisão de quem já cansou de ver esse filme.
Os detalhes que doem
Olha só: no canto inferior direito, quase imperceptível, tem um deputado com a expressão de quem acabou de roubar o pote de biscoitos. Coincidência? Duvido. O artista sempre coloca essas pérolas — quem acompanha seu trabalho sabe que nada ali é por acaso.
E o que dizer da figura central? Um político gordo de tanta regalia, sentado numa cadeira que mais parece um trono, enquanto segura um microfone como se fosse cetro. Até a gravata parece viva, estrangulando qualquer resquício de decência.
O Brasil em traços
O pior é que a gente ri para não chorar. Caesar tem esse dom: transforma o caos institucional em piada que, horas depois, vira amargo café da manhã. "É arte ou espelho?", me perguntou um amigo ao ver a charge. Respondi com outra pergunta: "Diferença existe?"
Numa época onde as manchetes parecem roteiro de distopia, o humor gráfico cumpre papel essencial. Alivia a tensão, mas também cutuca — com força — onde mais dói. E J.Caesar, velho lobo do ofício, sabe exatamente onde apertar.
Ah, e não me venham com esse papo de "humorista precisa ser imparcial". Imparcialidade, nesse caso, seria crime. Quando a realidade já é caricatura, o artista só precisa não perder o timing. E esse, definitivamente, ele não perdeu.