Dívida pública pode chegar a 125% do PIB em 2027, alertam especialistas
Bomba-relógio fiscal ameaça economia brasileira em 2027

Bomba-relógio fiscal: o desafio inevitável de 2027

O próximo presidente do Brasil, seja Luiz Inácio Lula da Silva ou qualquer outro candidato, herdará em 2027 uma situação fiscal crítica que transformará a expressão "herança maldita" - tão comum no vocabulário petista - de recurso retórico em realidade incontornável. O colapso iminente das contas públicas e a desmoralização das regras fiscais representam uma bomba-relógio prestes a explodir.

O colapso do arcabouço fiscal

O arcabouço fiscal, criado pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad e apresentado como símbolo de responsabilidade fiscal, ruiu diante da incapacidade do governo de cumprir suas próprias regras. A lei que substituiu o teto de gastos em 2023 prometia impor limites aos gastos públicos e estabelecer metas para o resultado fiscal, mas não resistiu ao primeiro teste da realidade.

Segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado, até o final do atual mandato, cerca de R$ 150 bilhões terão sido executados fora das regras da nova âncora fiscal. O rombo continua aumentando: em novembro de 2025, o Congresso aprovou a retirada de mais R$ 30 bilhões em gastos com Defesa da contabilidade oficial até 2031.

"O governo descumpre as regras o tempo todo", afirma o economista Marcos Mendes, pesquisador do Insper. "As despesas tiradas das regras são despesas de qualquer jeito e fazem a dívida pública crescer da mesma forma."

Dívida em trajetória explosiva

Desde que Lula retornou ao poder em janeiro de 2023, a dívida bruta do país saltou de 71% para 78% do PIB. O cenário futuro é ainda mais preocupante: a IFI projeta que o encargo pode alcançar 125% do PIB dentro de uma década, caso nenhuma medida concreta seja adotada para conter o desequilíbrio crescente.

No mercado financeiro, a percepção de que a regra fiscal não cumpre mais sua função básica - conter o avanço da dívida pública - já virou consenso. "A cada ano aumenta o número de despesas fora do arcabouço, e o resultado é que ele não serve para mais nada", diz Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da gestora ARX Investimentos.

O descontrole tem efeito em cadeia: com a dívida em trajetória explosiva, cresce a desconfiança dos investidores que financiam o governo ao comprar títulos públicos. O reflexo é direto sobre os juros: a taxa básica permanece em 15% ao ano, mantida nesse patamar elevado pelo Banco Central.

Novas ameaças no horizonte

Enquanto a situação atual já preocupa, novas ameaças surgem no horizonte. Tramita no Senado projeto que retira do alcance da regra fiscal as despesas com educação e saúde financiadas pelo Fundo Social do Pré-Sal - cerca de R$ 1,5 bilhão - além dos gastos custeados por empréstimos internacionais.

Outra proposta em discussão no governo para angariar popularidade é um programa de transporte público gratuito em todo o país. Independentemente do mérito social, o custo anual seria de R$ 90 bilhões - quase três vezes o déficit máximo de R$ 31 bilhões que o governo se esforça para conter em 2025.

Os analistas já voltam atenção para o ano eleitoral de 2026. "Tudo indica que teremos uma expansão fiscal significativa", afirma Felipe Tavares, economista-chefe da corretora BGC Liquidez.

O desafio do próximo governo

O próximo presidente não terá apenas a tarefa de preservar a regra fiscal existente, mas de provar que ela ainda pode ficar de pé. A própria equipe econômica do governo Lula, chefiada por Haddad e Simone Tebet, ministra do Planejamento, reconhece problemas no horizonte para 2027.

O avanço dos gastos obrigatórios, impulsionado por pisos constitucionais e pela indexação de benefícios ao salário mínimo, ameaça estrangular o caixa destinado às despesas básicas. "Nenhuma regra vai funcionar se não mudarmos alguns dispositivos que pressionam o Orçamento", diz Fabio Giambiagi, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas.

Apesar de ter reconhecido, no início do ano, que faltarão cerca de R$ 12 bilhões para despesas discricionárias em 2027, o Ministério da Fazenda insiste em minimizar a gravidade do problema. Em nota à VEJA, a pasta afirmou que "o próximo mandato presidencial começará em 2027 com uma situação fiscal sólida" - declaração que contrasta com as projeções de especialistas e instituições independentes.

A realidade que se impõe é clara: sem uma reforma profunda do Orçamento e uma revisão séria dos gastos, o país continuará marchando rumo ao abismo financeiro, e a tal "herança maldita" deixará de ser retórica para se tornar herança real do próximo ocupante do Planalto.