Casa Azul fecha as portas: brasileira vive momentos emocionantes de despedida no Japão
Casa Azul no Japão fecha após décadas acolhendo brasileiros

Era como se o tempo tivesse parado dentro da Casa Azul. Aquele cheiro de feijoada que escapava pela cozinha, as risadas altas no sotaque carregado de Minas ou Bahia, as fotos desbotadas na parede contando décadas de saudade. Agora, as cadeiras estão empilhadas, o balcão, vazio. O último gole de café foi servido.

"Aqui foi meu porto seguro quando cheguei, perdida, em 2005", diz Mariana, enxugando os olhos com a manga do casaco. Ela é uma das últimas a sair. O relógio marca 16h23 em Tóquio quando a placa "Fechado" vira de vez.

O fim de uma era

Quem diria que um boteco com paredes azul-turquesa viraria símbolo da resistência migrante? Desde os anos 90, a Casa Azul acolheu gerações de brasileiros. Trabalhadores exaustos das fábricas, mães com filhos pequenos, idosos que nunca se adaptaram ao inverno rigoroso. Todos encontravam ali um pedaço do Brasil.

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"É o ciclo da vida, né?", filosofa Mariana enquanto embala um pote de pimenta caseira - lembrança da Dona Rosa, falecida em 2019. "A gente vem, planta raízes, mas o vento sempre muda de direção."

O que fica

Nas prateleiras vazias, restam histórias: o casal que se conheceu durante uma festa junina, o bebê que nasceu depois de a mãe comer bolinho de chuva (dizem que foi a massa que induziu o parto), as cartas nunca enviadas para parentes distantes.

O último samba ecoou às 3h da manhã. Violão desafinado, vozes roucas, pés descalços batendo no chão de madeira rachada. Até o final, a Casa Azul resistiu como um pedaço de Brasil teimoso em solo japonês.