
Era para ser o governo que finalmente libertaria a economia das amarras do Estado. Javier Milei, o presidente libertário que chegou ao poder prometendo dólar livre e fim da farra estatal, acaba de dar um passo que deixou muitos de seus apoiadores com um gosto amargo na boca.
Nesta quarta-feira (4), o Banco Central da Argentina (BCRA) decidiu intervir novamente no mercado de câmbio. A medida, que vai na contramão do discurso liberal radical, pegou todo mundo de surpresa. Mas, no fundo, a jogada revela um dilema cruel: até que ponto a teoria econômica resiste à realidade caótica de um país à beira do abismo?
O Que Exatamente Aconteceu?
O BCRA anunciou que vai voltar a vender dólares no mercado paralelo, o famoso "blue", para tentar conter a disparada da cotação. Sim, você leu certo. O mesmo governo que criticou ferrenhamente qualquer tipo de manipulação cambial agora está fazendo exatamente isso.
O peso argentino vinha sofrendo uma pressão insustentável nas últimas semanas. A moeda simplesmente despencava, e o temor de uma nova espiral inflacionária — em um país onde os preços já sobem mais de 200% ao ano — falou mais alto do que a ideologia.
Por Que Fazer Isso Agora?
Ah, a pergunta de um milhão de pesos. A justificativa oficial fala em "proteger o poder de compra dos argentinos" e "evitar a especulação". Soa familiar? Pois é. É um clássico.
Mas analistas apontam para algo mais concreto: as reservas internacionais. Elas estão num nível perigosamente baixo, e o governo parece ter percebido que não dá para segurar o rojão só com discurso. A queima de reservas para segurar o dólar é uma tática antiga, e Milei, contra todas as expectativas, acabou adotando o manual que sempre criticou.
É uma ironia das grandes. O paladino do liberalismo sendo forçado a usar as mesmas ferramentas que seus antecessores peronistas. A realidade, como sempre, é mais complexa do que os slogans de campanha.
E Agora, José?
Os mercados reagiram com… incredulidade. Há quem veja a medida como um pragmatismo necessário, um mal menor para evitar um colapso maior. Outros, porém, enxergam nisso uma traição aos princípios e um sinal de desespero.
O fato é que a aposta de Milei era alta. Ele prometeu um ajuste doloroso, porém rápido, que levaria a uma "dolarização" da economia. Mas a transição está se mostrando mais turbulenta do que o previsto. E quando a casa começa a pegar fogo, até os maiores liberais podem correr para buscar um balde d'água — mesmo que seja estatal.
O que isso significa para o futuro? Dificil dizer. Uma intervenção pontual pode ser apenas um desvio tático. Mas se virar a regra, o governo pode perder sua maior moeda: a credibilidade. E na economia, como na vida, a confiança é tudo. Ou quase tudo.