
Não é todo dia que você encontra uma plantação de café florescendo onde a terra parece dizer 'não'. Mas no coração do Mato Grosso do Sul, a família Martins ri da lógica agrícola — e do solo pedregoso — há exatos 40 anos.
"Quando meu avô começou, os vizinhos chamavam a gente de loucos", conta João Martins, 52 anos, enquanto passa os dedos por um ramo carregado de grãos vermelhos. "Diziam que café aqui era como plantar bananeira no Alasca".
Raízes que desafiam o solo
O segredo? Uma mistura de teimosia ancestral com técnicas adaptadas que fariam qualquer agrônomo coçar a cabeça. Eles usam:
- Sombra de árvores nativas (improvável para café arábica)
- Rotatividade com culturas que 'conversam' com o café
- Um sistema de irrigação caseiro que parece saído de um filme steampunk
Resultado: 15 hectares produzindo ano após ano, enquanto fazendas tecnológicas na região jogam a toalha.
Não é só café, é história em grãos
A filha mais nova, Ana, 19 anos, me mostra o caderno de anotações do bisavô — páginas amareladas com desenhos de plantas e lunares de café. "Isso aqui vale mais que diploma universitário", diz, com um orgulho que faz você querer provar o tal café ali mesmo.
E olha que o negócio quase acabou em 2008, quando uma geada atípica queimou 70% da plantação. "Ficamos com café pra três gerações tomar banho", brinca dona Marta, a matriarca. Mas replantaram tudo, claro.
O futuro em xícara
Enquanto grandes produtores brigam por produtividade, os Martins descobriram um nicho: café com identidade. "Nosso segredo é que não temos segredo", filosofa João. "Só fazemos do jeito que sempre fizemos — com paciência e respeito à terra."
E parece que o mercado concorda. Este ano, pela primeira vez, vão exportar para a Itália. Pequenos lotes, preço premium. Ironia? O mesmo país que colonizou o café no Brasil agora compra dos 'loucos' do Cerrado.
Pergunto se temem a concorrência das máquinas e fazendas high-tech. A resposta vem com risada e um gole de café coado no filtro de pano: "Robô não tem memória afetiva. E café sem história é só líquido amargo".