
O palco da música brasileira amanheceu mais silencioso, mais triste. A notícia chegou como um soco no estômago para fãs e colegas: Angela Ro Ro nos deixou. Aos 75 anos, a artista que era pura personalidade — e uma voz absolutamente inconfundível — partiu, deixando para trás uma obra que é puro pedaço da nossa cultura.
Não foi uma despedida abrupta, mas isso não torna a dor menor. Ela estava internada no Hospital Samaritano, na Zona Sul do Rio, há exatos 19 dias. Uma pneumonia teimosa, que se complicou. A informação, confirmada pela assessoria da artista, veio acompanhada daquele peso que só a perda de um ícone traz.
E que ícone. Angela Dinah Diniz Ro Ro, ou simplesmente Angela Ro Ro, era daquelas figuras raras. Não dava para fingir indiferença. Ou você a amava de paixão, pela sua honestidade brutal e seu talento que escorria por todos os lados, ou você simplesmente não a entendia. E talvez essa fosse a grande graça.
Muito Mais que "Simplesmente Sim"
Se você cresceu nos anos 80, é impossível que aquele piano marcante e a voz rouca de "Simplesmente Sim" não tenham invadido sua sala de estar pelo rádio ou pela TV. A música era um hino de autoconfiança, uma declaração de autoestima que ecoou forte numa geração. Mas reduzir Angela a um só sucesso é um crime de lesa-artista.
Sua carreira era um caleidoscópio de emoções. Dos discos que ousavam — como seu álbum de estreia, homônimo, de 1979 — às apresentações que eram eventos imprevisíveis e genuínos. Ela tinha uma presença de palco que podia ir do sublime ao ácido em um piscar de olhos, e era exatamente isso que a fazia ser tão real, tão humana.
E, cá entre nós, quantos artistas hoje teriam a coragem de ser tão autênticos? De abraçar suas contradições e vulnerabilidades com tanta naturalidade? Ela era um espírito livre numa indústria que, muitas vezes, prefere a pasteurização.
O Silêncio de um Piano
Fora dos holofotes, Angela era uma figura reservada. Sua batalha contra a pneumonia nos últimos dias foi travada longe das câmeras, com a discrição que sempre preferiu em momentos pessoais. O hospital tornou-se, involuntariamente, seu último camarim.
Agora, o que fica é a música. E que presente ela nos deu. Canções que falam de amor, mas não daquele meloso e fácil — falam de amor com raiva, com desejo, com medo, com verdade. Suas composições são como pequenos retratos de alma, e é por isso que continuam a falar tão alto com tanta gente.
O mundo artístico já começa a reagir. Das redes sociais aos grupos privados, a comoção é unânime. Perdemos uma das vozes mais originais que já tivemos. Uma artista que não tinha medo de ser complexa, difícil, e brilhante — tudo ao mesmo tempo.
O Rio de Janeiro, cidade que adotou e foi adotada por ela, chora. O Brasil chora. Mas, como bem dizia ela numa de suas frases mais célebres, "a vida é assim: segura na minha mão e vem". Angela Ro Ro segurou nossa mão por décadas com sua arte. Agora, é a nossa vez de não deixar sua memória cair no esquecimento.
Descanse em paz, Angela. E obrigado por tanto.