
O clima no velório era pesado, mas ao mesmo tempo cheio de histórias — cada pessoa ali carregava uma lembrança, uma risada, um traço do homem que fez o Brasil rir mesmo nos tempos mais sombrios. Aos 94 anos, Sérgio Jaguaribe, ou simplesmente Jaguar, partiu, deixando um vazio que só o seu traço irreverente poderia preencher.
Era naquele mesmo Rio que ele escolheu pra viver, na Zona Sul, que amigos, familiares e uma legião de fãs anônimos se reuniram pra dar o último adeus. O corpo do cartunista chegou por volta das 10h da manhã, e desde então não parou de chegar gente. Gente que riu com ele, que brigou com ele, que aprendeu com ele.
Um dos criadores d'O Pasquim, aquele jornal que botou o dedo na ferida da ditadura e não saiu de lá até arrancar gargalhadas — mesmo que fosse pra disfarçar o medo. Jaguar não era só um desenhista; era um resistente. Um dos caras que mostrou que o humor pode ser arma, escudo e abrigo, tudo ao mesmo tempo.
Vozes que ecoam no salão
Não demorou pra que o espaço ficasse pequeno. Colegas de profissão, jornalistas, artistas… todo mundo querendo contar uma história, lembrar uma piada, celebrar uma vida que foi, acima de tudo, bem vivida. Teve choro, é claro — como não ter? — mas também teve muito sorriso no canto do olho. Aquele de quem lembra de uma coisa boa.
— Ele faria piada até com isso — alguém comentou, sem conseguir segurar uma risada abafada. E é verdade. Jaguar nunca perdeu o timing, nem a coragem.
Familiares recebiam abraços apertados, olhos marejados, mas com a dignidade de quem sabe que a partida não apaga a presença. A filha, os netos… cada um com seu pedaço do que Jaguar foi: pai, avô, amigo, rebelde.
O legado que fica
Como resumir uma vida dessas? Impossível. Jaguar desenhou até onde deu, criticou até onde pôde, e riu — ah, como riu! — até o último momento. Deixa um Brasil diferente do que encontrou. Um país que, graças a ele e a tantos outros, aprendeu a rir de si mesmo pra não chorar.
O velório seguiu até as 16h, no cemitério da Penitência, no Caju. Uma cerimônia discreta, como ele gostava, mas cheia daquelas presenças que falam mais que discurso.
E o traço? Ah, o traço fica. Nas páginas amareladas d’O Pasquim, nas charges que ainda circulam por aí, na memória de quem acredita que o humor — quando é inteligente e corajoso — pode mudar tudo.