Tenente-coronel desabafa: 'Pior missão de um comandante' após comunicar mortes de militares no RS
Tenente-coronel desabafa sobre comunicar mortes no RS

Não é todo dia que um militar treinado para enfrentar situações extremas se vê diante de um desafio que vai além do campo de batalha. O tenente-coronel que teve a dolorosa tarefa de comunicar às famílias a morte de três militares em um acidente no Rio Grande do Sul não esconde a emoção ao relatar o episódio.

"É como carregar um tijolo de chumbo no peito", descreve o oficial, com a voz embargada. "Você treina para combate, para estratégia, mas nada prepara para olhar nos olhos de uma mãe e dizer que seu filho não voltará para casa."

O acidente que chocou a corporação

Naquela terça-feira, 13 de agosto, o que deveria ser uma rotina de transporte militar transformou-se em tragédia. Um caminhão do Exército saiu da pista na BR-386, próximo a Canoas, capotando múltiplas vezes. Três soldados - dois homens e uma mulher - não resistiram aos ferimentos.

Testemunhas do acidente contam que o veículo parecia "dançar" na pista molhada antes de perder completamente o controle. "Foi coisa de segundos, mas parecia câmera lenta", relata um motorista que parou para ajudar.

O protocolo que dói

O tenente-coronel, com mais de 20 anos de serviço, nunca imaginaria que sua pior missão não envolveria armas ou inimigos. "Temos um protocolo rígido para essas notificações", explica. "Dois oficiais uniformizados, sempre pessoalmente, nunca por telefone."

Mas os manuais não preparam para:

  • O gemido gutural de um pai ao receber a notícia
  • A pergunta "por que o meu?" que ecoa na sala silenciosa
  • O olhar vazio de quem ainda não processou a informação

"Você vira psicólogo, padre, amigo - tudo ao mesmo tempo", confessa o militar, esfregando as mãos como se ainda tentasse apagar a memória.

As vidas por trás das fardas

Os três militares mortos tinham histórias que vão além do serviço:

Carlos Eduardo, 22 anos - sonhava em ser piloto de helicóptero. Deixou uma noiva e um cachorro resgatado das ruas.

Amanda, 24 anos - única mulher da família a seguir carreira militar. Escrevia poesias escondido no quartel.

Roberto, 28 anos - pai de gêmeos de 3 anos. Chamava os filhos de "soldadinhos" e prometeu levá-los ao quartel no dia seguinte.

"Esses detalhes são os que mais cortam", murmura o tenente-coronel. "Saber que por trás de cada nome há sonhos interrompidos, rotinas que não serão retomadas."

O peso do uniforme

Entre um gole de café amargo e outro, o oficial reflete sobre o paradoxo da profissão: "Treinamos para dar a vida, mas nunca para lidar com a morte dos nossos". Apesar do protocolo impecável durante as notificações, ele admite ter chorado no banheiro do quartel depois.

"O Exército nos ensina a ser fortes, mas há momentos em que a humanidade vence o soldado", filosofa, ajustando a boina com mãos trêmulas.

Enquanto as investigações sobre as causas do acidente continuam, uma coisa é certa: nenhum treinamento militar poderia ter preparado esses corações para tamanha dor. E, nas palavras do tenente-coronel, "algumas feridas não fecham com promoções ou medalhas".