Motos lideram vendas em 16 estados do Brasil e viram símbolo de trabalho
Motos são veículo mais popular em 16 estados brasileiros

O cenário do transporte no Brasil está passando por uma transformação significativa, com as motocicletas assumindo a dianteira nas ruas de boa parte do país. Em 16 estados, as motos já são o veículo mais emplacado, sinalizando uma mudança de hábitos que combina necessidade econômica, agilidade no trânsito e novos modelos de trabalho.

Uma realidade que antecipou o futuro

Cidades do interior ilustram de forma clara essa tendência nacional. Em Sobral, no Ceará, os números são reveladores: enquanto existem 31 mil carros registrados, as motos somam impressionantes 71 mil unidades. Para Carlos Henrique Lino de Castro, que trabalha como guardador de veículos, o movimento é parte do cotidiano. "No dia a dia, 200 motos por dia a gente fica cuidando, né? E, no andar da carruagem, eu sustentei duas filhas. Hoje elas são formadas", relata ele, mostrando o papel crucial desse meio de transporte na subsistência de muitas famílias.

Especialistas apontam que locais como Sobral anteciparam em pelo menos uma década um movimento que hoje se espalha pelo país. A liderança das motocicletas e motonetas nas emplacagens é uma realidade em Mato Grosso, em toda a região Norte e em grande parte do Nordeste.

Do campo de batalha às ruas: a moto como ferramenta de trabalho

A história das motos como veículo de massa tem raízes na Primeira Guerra Mundial, onde eram usadas para logística. Hoje, nas grandes cidades brasileiras, elas carregam um duplo significado: são tanto uma ferramenta de batalha diária quanto um símbolo de autonomia. Seja qual for o contexto, o destino final é quase sempre o mesmo: o trabalho.

O crescimento vertiginoso do número de motos reflete uma mudança de comportamento acelerada por fenômenos econômicos. Os dados mostram que este é, predominantemente, o veículo do trabalhador autônomo, que enfrenta o trânsito caótico em busca de oportunidades. Nesse novo panorama, o entregador por aplicativo emerge como personagem central. "Eu acho muito mais vantajoso do que você ficar aí de segunda a sexta, segunda a sábado, às vezes de segunda a segunda, fixo ali tendo toda aquela rotina monótona", opina o entregador autônomo Cristiano Neves Martins.

Para outros profissionais, como mecânicos autônomos, a moto significa eficiência e aumento de produtividade. "Um retorno muito grande, né, da minha profissão? Eu dependo da minha locomoção, então vai me trazer um giro muito alto", comenta o mecânico Marcio Oliveira, que consegue visitar mais clientes por dia. O acesso facilitado, com financiamentos que podem chegar a 48 parcelas, ajuda a explicar por que as motos não ficam paradas nas concessionárias.

Agilidade e risco: os dois lados da moeda

Outro perfil importante de comprador é o que busca simplesmente um meio de transporte ágil. "Não existe um jeito mais rápido, prático do que você se locomover de moto em São Paulo", afirma Paulo Sergio da Rocha Junior, gerente de uma serralheria. No entanto, a busca por agilidade convive com um risco elevado.

No estado de São Paulo, as mortes em acidentes com motocicletas atingiram um recorde preocupante no primeiro semestre de 2025, com 1.338 óbitos. Medidas para aumentar a segurança, como a implementação da faixa azul em 46 vias da capital paulista, mostram resultados positivos, reduzindo pela metade o número de acidentes fatais nessas áreas. O projeto experimental cria um espaço sinalizado para a circulação de motos entre os carros.

Para Aquilla dos Anjos Couto, diretor de Comunicação da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego), iniciativas como essa ajudam, mas não são suficientes. "A velocidade é o principal fator de risco hoje para o sinistro de trânsito, para queda, para colisão, para quem cai machuca, mata e morre também", alerta o especialista.

O caminho apontado por analistas é a adaptação das cidades a essa nova realidade. A onda de motos no país pode até desacelerar em algum momento, mas dificilmente vai retroceder. Como resume o entregador Cristiano Martins: "Não compro carro, não volto para escritório. Deixa eu quietinho no meu cantinho que tá muito bom". A moto se consolidou não apenas como um veículo, mas como parte integrante do modelo de vida e trabalho de milhões de brasileiros.