Enquanto o governo federal americano retrocede em políticas climáticas, uma força silenciosa mantém os Estados Unidos no caminho do Acordo de Paris. Segundo Nate Hultman, ex-assessor do Departamento de Estado e diretor do Center for Global Sustainability da Universidade de Maryland, 75% da economia americana já opera em sintonia com as metas climáticas globais.
Em entrevista exclusiva durante a COP30 em Belém, Hultman revelou que a coalizão America Is All In, formada por estados, cidades e empresas, criou um "país dentro do país" comprometido com a descarbonização. Esta aliança representa a segunda maior economia do mundo, se considerada isoladamente.
O motor subnacional da transição energética
Hultman explica que a estrutura federal americana impede que Washington "desligue completamente" a transição energética. Estados, cidades e condados mantêm competências próprias que permitem avanços concretos em energia limpa, edificações sustentáveis, transporte e gestão de resíduos.
"Estas ações, mesmo isoladas, estão evitando que os EUA sigam por um caminho pior e nos mantêm mais próximos de uma trajetória de Paris do que muitos imaginam", afirmou o especialista durante a conferência climática.
Números que impressionam
Os dados compilados pelo centro de pesquisas de Hultman mostram que:
- A coalizão subnacional pode reduzir as emissões americanas em 45% até 2035 em relação aos níveis de 2005
- Com reengajamento federal após as eleições, a redução pode chegar a 55% no mesmo período
- Os 24 estados da U.S. Climate Alliance já reduziram emissões em 24% desde 2005 enquanto cresciam economicamente em 34%
"Estas iniciativas criam uma base de transição que prepara o terreno para um eventual retorno do governo federal a uma política climática mais ambiciosa", destacou Hultman.
Governo como obstáculo e mercado como solução
Questionado sobre o principal gargalo para a descarbonização, Hultman foi direto: "o obstáculo, neste momento, é o próprio governo nacional". Ele criticou o incentivo continuado a opções fósseis como turbinas a gás, que considera mais lentas, caras e poluentes.
"Estas tecnologias estão atrasando um movimento que o mercado já está empurrando - porque as pessoas querem energia acessível, e hoje as fontes limpas são as mais baratas", explicou.
Apesar dos desafios, o ex-assessor mantém otimismo: "em dois a quatro anos, podemos retomar o ritmo de implantação de tecnologias limpas", projetou, baseando-se nas forças de mercado e políticas estaduais.
Diplomacia climática em tempos de incerteza
Hultman defende que a liderança climática americana vai além da diplomacia formal. "O mundo precisa saber que, mesmo com o cenário político atual, 75% da economia americana ainda reconhece o desafio climático e segue atuando", afirmou.
Ele sugere que a credibilidade americana seja medida pelo custo da eletricidade e pela trajetória real das emissões. "A acessibilidade da energia é um tema que importa para os eleitores e pode ser alcançada com solar e eólica", completou.
Como mensagem final para a COP30, Hultman resumiu: "A liderança de prefeitos e vereadores nos Estados Unidos está entregando muito mais do que as pessoas imaginam" e manterá o país no caminho do net zero até 2050.