O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, acionou o Supremo Tribunal Federal nesta quarta-feira (19) para contestar o decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que homologou e ampliou Terras Indígenas no estado. A medida judicial ocorre apenas três dias após o anúncio público do governador sobre a intenção de recorrer à Justiça contra a decisão federal.
O conflito jurídico sobre o marco temporal
A ação judicial protocolada pelo governo estadual argumenta que o decreto presidencial é inconstitucional por violar a lei 14.701 de 2023, que estabeleceu o marco temporal para territórios indígenas. Segundo essa legislação, os povos originários só podem reivindicar a demarcação de terras que já ocupavam em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
A Procuradoria-Geral do Estado identificou como especialmente problemática a ampliação da Terra Indígena Manoki, localizada em Brasnorte. A área saltou de 46 mil para 252 mil hectares, um aumento que according to a PGE, contraria dispositivos legais vigentes.
Impactos territoriais e sociais
Além da Terra Indígena Manoki, outras duas áreas foram homologadas em Mato Grosso: a Terra Indígena Estação Parecis, em Diamantino, e a Terra Indígena Uirapuru, que abrange os municípios de Campos de Júlio, Nova Lacerda e Conquista D'Oeste. Uma quarta terra indígena situada entre Pará e Amazonas também foi reconhecida.
O governo estadual alerta que a expansão afetará centenas de produtores rurais e famílias que possuem títulos legítimos de propriedade e Cadastros Ambientais Rurais ativos. Em alguns casos, há até decisões judiciais reconhecendo a ocupação regular dessas áreas por não indígenas.
Segundo a ação, existem registros históricos e jurídicos comprovando que partes dessas terras foram ocupadas por famílias não indígenas desde a década de 1950, com conhecimento do poder público.
Contexto indígena e conflitos territoriais
Do outro lado da disputa, lideranças indígenas comemoraram a homologação como resultado de anos de luta por reconhecimento de direitos. Eles enfrentam ameaças de morte, desmatamento ilegal e disputas territoriais constantes.
Um relatório do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) revela que apenas em 2024, já foram registrados 18 casos de conflitos e disputas territoriais envolvendo indígenas em Mato Grosso. Além disso, ocorreram 32 casos de invasão, exploração ilegal de recursos naturais e danos ao patrimônio indígena no estado.
Atualmente, Mato Grosso possui 73 terras indígenas demarcadas, totalizando aproximadamente 15 milhões de hectares - o equivalente a 16% de todo o território estadual.
A ação judicial foi anexada ao processo do marco temporal que já tramita no STF, onde são realizadas audiências de conciliação sobre o tema. O Congresso Nacional promulgou a lei do marco temporal em 2023, antes da conclusão do julgamento pelo Supremo, que anteriormente já havia considerado a tese inconstitucional.