A inteligência artificial tem gerado um debate intenso sobre o futuro do mercado de trabalho no Brasil e no mundo. Ferramentas como o ChatGPT, que auxiliam na escrita, no raciocínio e na criação, já são uma realidade no dia a dia de diversas profissões, levantando a questão inevitável: até que ponto as máquinas vão substituir os humanos?
Quais profissões estão na linha de frente?
Os especialistas consultados pela reportagem foram unânimes em um ponto: as funções manuais e com rotinas repetitivas são as mais vulneráveis. Alexandre Trinhain, engenheiro especialista em propriedade intelectual, citou como exemplos concretos a auditoria financeira, que segue uma cartilha padronizada, e a tradução.
Trinhain também incluiu na lista profissões que, à primeira vista, podem surpreender: o jornalista com baixo nível investigativo, o matemático, o engenheiro de dimensionamento de obras e o redator de patentes. A visão da própria inteligência artificial parece corroborar essa análise.
Quando questionado, o ChatGPT listou dez categorias profissionais que considera em risco devido à natureza repetitiva ou corriqueira de suas tarefas. A lista gerada pela IA inclui:
- Operadores de telemarketing e atendimento ao cliente.
- Motoristas de caminhão e entregadores.
- Caixas de supermercado e atendentes de lojas.
- Escriturários e assistentes administrativos.
- Advogados e outros profissionais jurídicos.
- Contadores e auditores.
- Analistas de dados e estatísticos.
- Profissionais de marketing e publicidade.
- Jornalistas e escritores.
- Profissionais de recursos humanos.
Um cenário de incertezas e ressalvas
No entanto, nem todos os especialistas encaram essa lista como uma sentença definitiva. Ricardo Kahn, consultor em inovação, faz uma ressalva importante. Ele lembra que muitos desses cargos já foram apontados como ameaçados por ondas tecnológicas anteriores e, ainda assim, continuam existindo.
“A verdade é que a gente não sabe [quais profissões serão substituídas]. Eu diria que isso tudo é complexo. São coisas que parecem inteligentes para falar hoje, mas a realidade é que a gente não tem muita noção disso”, afirmou Kahn, destacando a imprevisibilidade do cenário.
A preocupação com o ritmo acelerado dos avanços é tão grande que, em março de 2023, cientistas e personalidades como Elon Musk assinaram um pedido público para que as pesquisas em IA de grande porte fossem suspensas por seis meses. O objetivo seria dar um tempo para que governos e a economia global se preparassem para os impactos profundos dessa tecnologia.
Como o trabalhador pode se preparar para o futuro?
Diante dessa transformação iminente, a grande dúvida é: como se proteger? Os especialistas concordam que a atualização constante é fundamental, mas vão além. Walmir Torrente, programador autodidata e presidente-executivo da Bit One, é direto: não tente competir com a máquina.
“Você não vai conseguir correr do lado de um carro, entende? O carro anda muito mais rápido que você, é impossível competir”, compara. A estratégia, segundo ele, é aprender a usar ferramentas como o ChatGPT a seu favor, focando no que a inteligência artificial ainda não é capaz de fazer.
Torrente usa o exemplo da medicina. A IA pode realizar a triagem inicial de sintomas e solicitar exames básicos. O diferencial do médico está na experiência, na intuição e na capacidade de interpretar nuances humanas que vão além dos dados puros. Alexandre Trinhain segue a mesma linha, aconselhando os trabalhadores a entenderem profundamente as limitações da IA e a se especializarem justamente nessas lacunas.
“[O empregado precisa] explorar esse diferencial que a ferramenta ainda não tem e estudar em cima dessa diferença”, recomenda o engenheiro. Ele reconhece, porém, que essa “diferença” tende a diminuir com o aprimoramento constante dos sistemas. Por isso, a chave para a empregabilidade no futuro será a capacidade de estar sempre um passo à frente, antecipando as próximas limitações que a IA tentará superar e desenvolvendo habilidades genuinamente humanas, como criatividade complexa, pensamento crítico e inteligência emocional.