Um casal de palestinos provenientes da Faixa de Gaza encontra-se retido há cinco dias na área restrita do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, depois de solicitar refúgio humanitário às autoridades brasileiras. Yahya Ali Owda Alghefari, de 30 anos, e Tala Z. M. Elbarase, de 25, desembarcaram no Brasil na quinta-feira (20) em um voo proveniente do Egito com destino final programado para a Bolívia, mas decidiram permanecer no país e requerer proteção internacional.
O pedido de refúgio e a resposta das autoridades
Imediatamente após o pouso da aeronave, o casal procurou a Polícia Federal para manifestar formalmente a intenção de solicitar refúgio. Contudo, de acordo com o advogado Willian Fernandes, que representa os palestinos, a PF não registrou o pedido verbal e começou a tratá-los como passageiros em trânsito, com possibilidade de repatriação. Os passaportes do casal permaneceram retidos com a Qatar Airways, empresa aérea responsável pelo trecho até Guarulhos.
Diante do risco de devolução imediata, a defesa ingressou com um pedido de habeas corpus na Justiça Federal. A juíza plantonista Letícia Mendes Martins do Rego Barros concedeu parcialmente a liminar para impedir qualquer medida de retirada compulsória do país, determinando que ambos permaneçam sob custódia da Polícia Federal até nova decisão judicial.
Fundamentação legal e documentos apresentados
No pedido de habeas corpus, o advogado sustentou que a Polícia Federal descumpriu normas nacionais e internacionais ao não registrar o pedido verbal de refúgio, obrigação prevista no artigo 4º da Lei 9.474/1997 e na Resolução Conare nº 18/2014. A magistrada destacou que a eventual repatriação violaria o princípio do non-refoulement, previsto na Convenção de Genebra de 1951 e incorporado à legislação brasileira, que proíbe a devolução de solicitantes de refúgio para locais onde sua vida ou integridade física possam estar em risco.
O casal apresentou à Justiça diversos documentos oficiais que comprovam identidade, origem e histórico pessoal, incluindo:
- Certidões de nascimento
- Carteiras de identidade palestinas
- Certidão de casamento reconhecida pela Embaixada da Palestina
- Diploma universitário de Yahya
- Comprovante de experiência profissional de Tala como farmacêutica no Hospital Al-Sahaba
Rede de apoio e situação atual
Documentos apresentados ao processo demonstram que o casal já possui uma rede de apoio organizada para acolhimento no Brasil. A ONG Refúgio Brasil declarou que ambos têm vínculos afetivos e comunitários no país e que existe um plano de moradia preparado para recebê-los. A entidade afirmou ainda que não há indícios de tráfico de pessoas ou contrabando.
O Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante (CDHIC) também emitiu declaração confirmando a condição humanitária do casal e oferecendo apoio para integração social, destacando que se tratam de "indivíduos oriundos de uma região de guerra, submetidos a condições extremas".
Após a concessão da liminar, a Polícia Federal foi notificada e deve prestar informações em 24 horas. Enquanto aguardam a decisão definitiva, Yahya e Tala permanecem hospedados no único hotel existente dentro da área restrita do aeroporto, o TRYP by Wyndham São Paulo Airport.
A hospedagem de Tala está sendo custeada pela Qatar Airways, conforme regras internacionais aplicáveis a passageiros inadmitidos, mas a de Yahya precisa ser paga por ele próprio, o que a defesa considera um efeito indevido da ausência de definição administrativa e judicial.
O advogado Willian Fernandes afirmou que "o casal está em um limbo jurídico" e que "o direito de solicitar refúgio é garantido pela lei e pelos tratados internacionais". A defesa protocolou nova petição pedindo que a Justiça determine a entrada condicional no país ou a imediata liberação do casal para aguardar o processamento do refúgio na rede de acolhida que já os aguarda.