O acordo de livre-comércio entre o Mercosul e a União Europeia, após 26 anos de negociações, encontra-se novamente em uma encruzilhada política. Apesar de tecnicamente finalizado, a assinatura prevista para 2025, possivelmente durante a Cúpula do Mercosul em Foz do Iguaçu, esbarra em uma forte resistência liderada por França e Itália, motivada por pressões internas e pelo calendário eleitoral europeu.
O Relógio Político Contra o Acordo
Especialistas alertam que o tempo é um inimigo crucial para a concretização do pacto. Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, destaca que o presidente Lula tem razão em buscar o fechamento ainda em 2025, pois em 2026 "tudo vira eleição". O risco é que, à medida que o ano avança, o debate comercial seja substituído pelo cálculo eleitoral nos países europeus, podendo simplesmente tirar o acordo da mesa de negociações.
O peso econômico do acordo é monumental, envolvendo um PIB combinado de cerca de 22 trilhões de dólares e uma população superior a 700 milhões de pessoas. Para o Brasil, a União Europeia já é o principal parceiro comercial entre os blocos econômicos, respondendo por quase 30% das exportações brasileiras.
A Resistência de Paris e Roma
O principal obstáculo continua sendo a oposição de França e Itália. O presidente francês, Emmanuel Macron, e a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, enfrentam uma pressão intensa de seus agricultores, que veem nos produtos agropecuários do Mercosul uma concorrência direta e temem perder competitividade.
Recentemente, Giorgia Meloni classificou como "prematuro" assinar o tratado agora, um sinal claro de que o freio é político e eleitoral. Meloni, da extrema direita italiana, tem forte ligação com o setor agrícola, enquanto Macron busca se alinhar aos produtores rurais que tradicionalmente apoiam a oposição em seu país.
Thiago Holtz, da A7 Capital, lembra que a resistência nunca foi segredo: "A França sempre foi explícita na oposição, usando argumentos sanitários e ambientais. A Itália também nunca foi entusiasta". Embora tenham ocorrido avanços técnicos, como ajustes em limites de importação, eles foram insuficientes para superar o temor político.
As Consequências do Impasse
Os economistas acreditam que a postura de Itália e França visa, acima de tudo, agradar eleitores e setores da oposição, pensando no cenário político interno que se desenha para 2026. A perda para a União Europeia como bloco, no entanto, pode ser maior do que o ganho político de proteger um setor específico, dado o potencial de crescimento que o acordo representa.
O impasse coloca em risco a ampliação de uma relação comercial já sólida. O Brasil já possui presença significativa no mercado europeu, e o tratado buscaria justamente expandir e aprofundar essa conexão, eliminando barreiras tarifárias e harmonizando regras.
No fim, o acordo Mercosul-União Europeia repete um roteiro conhecido: tecnicamente maduro e economicamente relevante, mas politicamente travado. O desafio final, após mais de duas décadas, não é mais técnico, mas sim convencer governos europeus de que abrir mercados pode render mais benefícios do que fechá-los, mesmo em um ano eleitoral.