Congresso derruba vetos e estatais acumulam prejuízos recordes
A situação das contas públicas do Governo Federal enfrenta uma pressão crescente após duas decisões importantes nesta semana. Na quinta-feira (27), o Congresso Nacional derrubou vetos presidenciais ao Programa de Renegociação das Dívidas dos Estados, enquanto na sexta-feira (28) o Banco Central revelou números alarmantes sobre o desempenho das empresas estatais federais.
Rombo bilionário nas estatais preocupa economistas
As empresas estatais federais acumularam um prejuízo de R$ 6,35 bilhões em apenas dez meses, valor que se aproxima rapidamente do recorde histórico de todo o ano de 2024, que foi de R$ 6,734 bilhões. Este é o pior resultado desde o início da série histórica em 2002.
Os Correios foram os principais responsáveis por agravar este cenário, acumulando sozinhos um prejuízo de R$ 6 bilhões até o terceiro trimestre. A sequência de déficits preocupa especialistas: em 2025, o rombo já atingiu R$ 7,4 bilhões de janeiro a outubro, enquanto em 2024 totalizou R$ 8 bilhões e em 2023 foi de R$ 2,3 bilhões.
Fernando Rocha, chefe de estatísticas do Banco Central, alerta: "Essa sequência de déficits mostra que, de fato, a tendência da dívida líquida é de aumento. E se esses resultados forem devidos a investimentos e se eles se provarem rentáveis, podemos imaginar um equilíbrio, mas o que temos visto nos últimos três anos é um aumento da dívida líquida, que gera uma maior conta de juros".
Impactos diretos no orçamento público
Como consequência direta do rombo maior que o previsto para 2025, o Governo Federal precisou bloquear R$ 3 bilhões do orçamento. Este valor, que poderia ser destinado a serviços básicos para a população, agora será utilizado para compensar os resultados negativos das estatais federais.
O Ministério da Gestão e da Inovação defendeu as empresas estatais, afirmando em nota que o déficit não pode ser interpretado como prejuízo operacional, sendo resultado principalmente do aumento de investimentos e pagamento de dividendos.
Congresso flexibiliza regras para dívidas estaduais
A situação se complica ainda mais com a decisão do Congresso de derrubar seis vetos do Governo à Lei que criou o Programa de Renegociação das Dívidas dos Estados. Com esta medida, os Estados ganham novas facilidades para abater suas dívidas com a União.
Agora, quando um Estado recapave uma estrada federal, poderá descontar esse gasto de sua dívida. O mesmo vale para serviços com segurança, defesa civil e saúde. Além disso, os Estados poderão utilizar recursos do Fundo de Desenvolvimento Regional para pagar juros da dívida, embora o propósito original do fundo seja financiar projetos de infraestrutura, desenvolvimento tecnológico e inovação.
As medidas beneficiam principalmente os Estados mais endividados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Goiás respondem por mais de 90% das dívidas estaduais. O montante devido chega a aproximadamente R$ 820 bilhões em contratos, além de R$ 100 bilhões em precatórios (dívidas judiciais).
Especialista alerta para consequências para a população
Armando Castelar, economista e pesquisador da FGV, analisa que a combinação do rombo das estatais com a permissão para Estados renegociarem dívidas já em processo de renegociação e o aumento das despesas públicas terá efeitos concretos na vida dos brasileiros.
"É todo mundo tentando dar uma abocanhada no bolo, como se o bolo não tivesse que ser pago depois. O resultado é uma carga tributária muito alta no Brasil, atrapalha o crescimento econômico, gera informalidade", afirma Castelar.
O pesquisador destaca ainda o custo de oportunidade: "A gente deixa de fazer investimentos necessários para cobrir gastos correntes, para cobrir prejuízos de empresas. Um bom exemplo é esse do prejuízo dos Correios, que aumentou o déficit das estatais e forçou o Governo a cortar outros gastos. Isso chega na forma de menos gasto de saúde, menos investimentos em segurança, em mobilidade urbana".
Segundo Castelar, "os serviços sociais e públicos que a sociedade recebe são prejudicados porque se gasta com coisas que não beneficiam diretamente a população".