O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, adotou um tom de cautela extrema ao discursar para investidores em São Paulo nesta segunda-feira, 1º de dezembro de 2025. Em meio a um cenário econômico repleto de sinais contraditórios, a mensagem foi clara: o papel do BC é ser conservador quando a direção da economia não está totalmente clara.
Uma economia que desafia os manuais
A realidade macroeconômica do Brasil apresenta, atualmente, uma série de paradoxos que desafiam as previsões tradicionais. Enquanto a taxa básica de juros, a Selic, permanece em patamares historicamente elevados, o mercado de trabalho segue robusto, com desemprego em baixa e renda real em crescimento. Ao mesmo tempo, a inflação de serviços resiste teimosamente, mesmo após um longo ciclo de aperto monetário que, em tese, deveria ter arrefecido a demanda.
Galípolo reconheceu abertamente essa desconexão. "Se não sabemos exatamente o que está acontecendo, o papel do Banco Central é ser mais conservador", declarou durante evento realizado pela XP. Essa frase sintetiza a postura da autoridade monetária diante de um momento em que os modelos econômicos convencionais parecem ter perdido a eficácia para explicar a dinâmica nacional.
O enigma do mercado de trabalho e a força da demanda
Um dos maiores quebra-cabeças citados por Galípolo é a situação do emprego. Uma política monetária contracionista, com juros altos, normalmente levaria a um resfriamento da atividade econômica, redução de contratações e pressão sobre os salários. No Brasil, ocorre o oposto: os indicadores laborais permanecem fortes.
O presidente do BC rejeitou explicações simplistas para o fenômeno, como a tese do desalento – que sugere que a queda do desemprego se deve a trabalhadores que desistem de procurar emprego. "Com desemprego baixo, renda crescendo e salários de admissão em alta, é difícil acreditar em desalento", argumentou. Para ele, a conclusão é mais direta e desafiadora: o mercado de trabalho está simplesmente forte demais.
Essa força transborda para outros setores. O consumo, o comércio e os serviços mostram uma resiliência que contradiz a narrativa de uma desaceleração abrupta. A economia brasileira, na visão exposta no evento, insiste em demonstrar um vigor que dados setoriais isolados nem sempre capturam.
Conservadorismo como política ativa, não ideologia
Diante desse panorama complexo, Galípolo buscou diferenciar a postuta do BC. O conservadorismo, em sua fala, não é uma posição ideológica, mas uma política ativa e deliberada de gestão da incerteza. Em vez de se precipitar com cortes na taxa de juros baseado em leituras otimistas ou parciais dos dados, o Comitê de Política Monetária (Copom) opta por uma espera vigilante.
A estratégia é manter os juros no patamar necessário pelo tempo que for preciso para consolidar o controle da inflação, especialmente em seus componentes mais persistentes. A sinalização é de que a taxa Selic deve permanecer elevada enquanto o BC considerar necessário, sem ceder a pressões por uma normalização prematura do ciclo.
Essa abordagem busca, acima de tudo, não amplificar as incertezas inerentes a um momento econômico peculiar. Em um ambiente onde a própria realidade gera contradições, a instituição prioriza a estabilidade e a análise meticulosa, reforçando seu compromisso com o mandato de garantir a estabilidade de preços.