Déficit em Contas Correntes salta para US$ 77,7 bi em 12 meses, alerta BC
Déficit externo atinge 3,47% do PIB, mas IDP cresce

Os dados mais recentes do Balanço de Pagamentos, divulgados pelo Banco Central nesta sexta-feira (19), acenderam um sinal de alerta para as contas externas do Brasil. Embora o país mantenha um robusto volume de reservas cambiais, na casa dos US$ 360,6 bilhões, e um superávit comercial, o déficit em transações correntes vem se ampliando de forma preocupante.

Os números que preocupam

Nos primeiros onze meses de 2025, o déficit em transações correntes saltou de US$ 55,932 bilhões (em 2024) para US$ 67,496 bilhões. Em doze meses até novembro, o rombo atingiu US$ 77,7 bilhões, o equivalente a 3,47% do Produto Interno Bruto (PIB). Em novembro de 2024, esse valor era de US$ 61,5 bilhões (2,78% do PIB).

Apesar de as exportações de bens, que somaram US$ 28,672 bilhões em novembro (alta de 2,3%), superarem as importações (US$ 23,553 bilhões), gerando um saldo comercial positivo de US$ 5,119 bilhões, outras contas pesaram no resultado final.

Onde as despesas aumentaram

A conta de serviços, que compõe o balanço junto com a balança comercial e as rendas, apresentou piora em vários segmentos. As despesas líquidas com Viagens (turismo) aumentaram, elevando o déficit de US$ 11,353 bilhões para US$ 12,683 bilhões.

Outros itens que pressionaram foram:

  • Serviços de Propriedade Intelectual: déficit subiu de US$ 7,830 bi para US$ 10,096 bi.
  • Telecomunicações, Computação e Informações: déficit passou de US$ 6,882 bi para US$ 7,976 bi.
  • Aluguel de Equipamentos (área liderada pela Petrobras): aumento de US$ 10,065 bi para US$ 10,923 bi.

Além disso, as remessas de lucros e dividendos ao exterior, embora tenham tido uma ligeira redução devido à queda dos juros internacionais, ainda representam uma saída significativa de recursos, totalizando US$ 64,252 bilhões no período.

A luz no fim do túnel: o Investimento Direto

Contra o cenário de déficit, uma notícia positiva vem do Investimento Direto no País (IDP). Pelo terceiro mês consecutivo, o fluxo mostrou força, com ingressos líquidos de US$ 9,8 bilhões apenas em novembro de 2025. Em outubro, o valor foi de US$ 10,9 bilhões, e em novembro do ano anterior, de US$ 5,7 bilhões.

Os ingressos líquidos em participação no capital somaram US$ 7,3 bilhões, sendo US$ 3,5 bilhões em capital novo e US$ 3,9 bilhões em lucros reinvestidos. As operações intercompanhia somaram mais US$ 2,5 bilhões. Em 12 meses, o IDP totalizou US$ 84,3 bilhões (3,76% do PIB), superando os US$ 71,9 bilhões de novembro de 2024.

Analistas apontam que a manutenção da taxa Selic em patamar elevado (15% ao ano), enquanto outras grandes economias reduzem seus juros, tem sido um fator crucial para atrair esses capitais de longo prazo, que ajudam a financiar o déficit em conta corrente.

Lições do passado e o contexto atual

O artigo relembra a frase histórica do ex-ministro da Fazenda Mário Henrique Simonsen (1974-1979), durante a primeira crise do petróleo: “A inflação aleija; o balanço de pagamentos mata”. A advertência se materializou em 1982, quando o Brasil, sob o governo do general João Figueiredo e com Delfim Neto no comando da economia, declarou moratória e recorreu ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

Naquela época, as reservas se esgotaram e o país perdeu acesso a crédito para importar itens essenciais, como petróleo. A situação atual é radicalmente diferente. As exportações brasileiras são muito mais diversificadas, lideradas por petróleo, soja, milho e carnes, e as importações não enfrentam restrições quantitativas, apenas tarifárias.

Dados recentes do comércio exterior mostram as exportações mantendo força, em média de US$ 1,5 bilhão por dia útil no início de dezembro, enquanto as importações recuam para cerca de US$ 1,1 bilhão por dia. Essa melhora no fluxo comercial é vital para sustentar as crescentes despesas com remessas de lucros.

Em síntese, os números divulgados pelo BC pintam um quadro de atenção, mas não de alarme. O aumento do déficit em transações correntes exige monitoramento, porém é em grande parte financiado por um fluxo robusto e crescente de investimento direto estrangeiro, indicando que, por ora, o país tem conseguido atrair os recursos necessários para cobrir suas despesas externas sem desequilibrar as contas nacionais.