Frei Valdo, ícone religioso de Montes Claros, parte aos 76 anos: uma vida dedicada à fé e à comunidade
Frei Valdo, ícone religioso de Montes Claros, morre aos 76

Montes Claros perdeu nesta terça-feira (22) um de seus pilares espirituais. Frei Valdo, nome que ecoava não só nas igrejas, mas nos corredores de asilos, escolas e comunidades carentes, faleceu aos 76 anos. A notícia pegou muitos de surpresa — afinal, quem o conhecia jurava que aquele homem franzino carregava a vitalidade de um jovem.

Nascido em 1949, ele trocou o conforto da vida secular pelo hábito franciscano ainda nos anos 1970. "Não foi uma escolha, foi um chamado", costumava dizer, com aquela voz rouca que parecia guardar segredos de mil homilias. Em Montes Claros, onde viveu por quatro décadas, virou sinônimo de acolhimento: era o primeiro a chegar quando faltava comida no bairro periférico, o último a sair quando um doente precisava de oração.

O monge que plantava árvores (e esperança)

Quem pensa que freiro vive só de missas nunca conheceu Frei Valdo. Nos anos 1990, criou o projeto "Horta da Fraternidade" — mistura de cultivo orgânico com aula de cidadania para jovens em risco. "Terra que dá couve também dá futuro", filosofava, enlameado até os joelhos. Resultado? Duas gerações de agricultores urbanos que hoje sustentam famílias graças àquela semente plantada nos fundos da paróquia.

Mas nem tudo foram flores — ou melhor, couves. Em 2015, quando gangues rivais ameaçavam explodir a paz do bairro São José, foi ele, de crucifixo balançando no peito, quem atravessou as linhas de fogo para mediar a paz. "Padre, o senhor é louco?", perguntou um policial. "Não, filho. Só acredito mais no diálogo que no disparo", respondeu, antes de sumir na viela escura.

Admirável mundo Valdo

  • 1976: Chega a Montes Claros como jovem missionário
  • 1989: Funda a primeira sopa comunitária da cidade
  • 2007: Recebe título de cidadão honorário
  • 2021: Diagnosticado com enfisema pulmonar, mas segue atendendo fiéis

Nos últimos anos, mesmo com a saúde frágil — aqueles pulmões queimados por anos de cigarro antes da vocação —, mantinha o ritual: acordava às 5h, rezava o breviário tomando café coado no pano, e saía para visitar "seus velhinhos", como chamava os idosos do asilo municipal. "Envelhecer é obrigatório, ficar amargo é opcional", gracejava, enquanto distribuía biscoitos caseiros.

A causa da morte? Oficialmente, complicações cardiorrespiratórias. Mas os fiéis que lotaram a capela do Convento São Francisco hoje à tarde sabem que ele partiu por excesso de amor — aquele que doa até a última gota. O velório acontece até quinta-feira (24), com missa de corpo presente marcada para as 15h. A diocese já avisa: espera-se uma multidão. Afinal, como dizia o próprio frei: "Deus cabe numa igreja vazia, mas prefere festa com povo cheiroso de suor e esperança".