
O som do berimbau ecoou pelas margens do Tapajós neste sábado (3), transformando o calçadão de Santarém num palco de resistência cultural. Não era só mais um dia comum — era o Dia do Capoeirista, e a cidade vestiu-se de axé para celebrar essa arte que, diga-se de passagem, é muito mais que simplesmente um esporte.
Quem passou por lá viu de perto o que acontece quando corpo, mente e história decidem dançar juntos. Rodas se formavam espontaneamente, com mestres e alunos trocando golpes que parecem coreografia — mas que carregam séculos de sabedoria popular.
Raízes que não se apagam
"A capoeira nasceu como forma de resistência e sobrevivência", contou Mestre Zumbi, suando a camisa depois de uma sequência impressionante de meia-lua de compasso. "Hoje, ela virou símbolo, mas não podemos esquecer: cada movimento conta uma história de luta."
E que história! Originada pelos africanos escravizados no Brasil colonial, a capoeira já foi proibida, marginalizada. Hoje? Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO. Santarém, com sua forte herança afro-indígena, parece ter entendido na prática essa transformação.
Ginga que educa
Nas laterais das rodas, crianças observavam atentas, tentando imitar os movimentos dos mais experientes. Algumas sequer conseguiam disfarçar o sorriso — aquele tipo de alegria contagiante que só a capoeira sabe provocar.
"Aprendi mais sobre meu país numa roda de capoeira do que em muitos livros", confessou Ana Clara, 14 anos, enquanto ajustava seu abadá. "Aqui a gente sente na pele o que é cultura viva."
E não é exagero. A capoeira em Santarém vai além do espetáculo:
- Projetos sociais usam a arte como ferramenta educacional
- Grupos promovem inclusão através da musicalidade e movimento
- Rodas semanais mantêm viva a tradição nas comunidades
O evento deste sábado contou com apresentações de pelo menos 15 grupos locais — cada um com seu estilo próprio, mas todos compartilhando a mesma essência. Teve capoeira angola, regional, até adaptações contemporâneas que deixariam os puristas de cabelo em pé (mas que, convenhamos, mostram como a tradição segue evoluindo).
No final da tarde, quando o sol começou a se despedir sobre o rio, dezenas de capoeiristas se reuniram para uma grande roda final. Berimbaus, pandeiros e cantigas preencheram o ar enquanto os pés desenhavam movimentos precisos na areia. Era história se fazendo presente, resistência virando celebração.
Santarém, mais uma vez, provou que a capoeira não é só passado — é futuro em movimento.