
Numa quadra de terra batida em Vila Pirituba, zona norte de São Paulo, uma garota de 15 anos dribla a poeira e as dificuldades com a mesma facilidade com que domina a bola nos pés. E não é exagero dizer que ela tem um ídolo de peso na manga — ou melhor, nos pés.
"Quando vi os vídeos da Milene Domingues fazendo embaixadinhas, algo clicou na minha cabeça", conta a jovem, que prefere não revelar o nome por enquanto. "Aquela mulher jogava bola como ninguém, e ainda por cima era mãe. Se ela conseguiu, por que eu não poderia tentar?"
Da lama ao sonho
O campo improvisado onde treina três vezes por semana fica a quilômetros de distância — social e geograficamente — dos gramados bem cuidados dos grandes clubes. Mas a falta de estrutura não apaga o brilho nos olhos da adolescente, que divide seu tempo entre os estudos e os treinos puxados.
"Minha mãe diz que eu nasci com a bola colada no pé", ri, mostrando os joelhos ralados de tanto cair e levantar. "Mas a real é que treino feito louca desde os 10 anos."
Inspiração que vem de longe
Milene Domingues, a "Rainha das Embaixadinhas", parece ser mesmo o tipo de ídolo que faz diferença. Não só pela técnica absurda (ela detém o recorde mundial de embaixadinhas, pasmem!), mas pela trajetória cheia de obstáculos superados.
"O que mais me impressiona nela?", reflete a jovem, enquanto amarra o cadarço surrado do tênis. "É ver como ela virou o jogo. De jogadora profissional a comentarista esportiva... Mulher tem que ser versátil mesmo nesse mundão machista do futebol."
Obstáculos que não faltam
Entre um drible e outro, a realidade bate à porta:
- Transporte público lotado para chegar aos treinos
- Chuteiras que custam mais que o orçamento familiar do mês
- Olhares tortos de quem ainda acha que "futebol não é coisa de menina"
Mas ela nem pisca: "Desistir? Tá maluco! Se a Milene aguentou preconceito nos anos 90, imagina hoje em dia, que já temos até seleção feminina forte."
O futuro nos pés
Enquanto o sol se põe sobre o campinho poeirento, a jovem craque de Vila Pirituba ensaia mais uma jogada. Seus olhos brilham ao falar dos planos: "Quero jogar no Corinthians, igual ela. E quem sabe um dia representar o Brasil numa Copa do Mundo."
Pode parecer sonho distante? Talvez. Mas como diria a própria Milene em suas entrevistas: "No futebol, como na vida, o importante é não deixar a bola cair." E essa garota parece ter aprendido a lição direitinho.