
O silêncio no campo de futebol era quase palpável, quebrado apenas pelo ruído distante do trânsito e pelos soluços abafados. O que deveria ser mais um domingo de alegria e descontração no bairro Portal da Alegria, em Teresina, transformou-se num cenário de dor que ninguém poderia ter previsto.
Era por volta das 17h30 de sábado quando a vida de Kauan Silva, um garoto de apenas 12 anos cheio de sonhos e energia, foi interrompida brutalmente. Enquanto jogava futebol — sua paixão — com amigos, um disparo de arma de fogo, vindo sabe-se lá de onde, atingiu sua perna. O projétil não parou ali. Seguiu seu caminho destrutivo até alcançar o tórax do adolescente.
Uma Cena que Ninguém Esquece
Testemunhas contam que o caos se instalou instantaneamente. "A gente ouviu o barulho, mas pensou que era rojão ou algo assim", relatou um morador que preferiu não se identificar. "Só quando vi o menino no chão é que percebi a gravidade. Foi tudo muito rápido, e ao mesmo tempo parecia que o tempo tinha parado."
O Corpo de Bombeiros chegou rapidamente, mas o que encontraram era o pior pesadelo de qualquer família. Kauan já não respondia. Foi levado às pressas para o Hospital Municipal Torquato Neto, mas os médicos só puderam constatar o óbito. Simples assim. Uma vida inteira pela frente, reduzida a um laudo médico.
A Despedida que Ninguém Queria Dar
Mas foi no domingo que a comunidade mostrou sua força. Familiares e amigos — muitos deles crianças e adolescentes — se reuniram no mesmo campo onde a tragédia aconteceu. E fizeram algo extraordinário: organizaram uma partida de futebol em homenagem ao garoto.
E então aconteceu. Num momento de pura emoção, um dos amigos mais próximos de Kauan pegou a bola e, com uma calma que contrastava com a dor coletiva, chutou em direção ao gol. A rede balançou, e o que se seguiu foi um misto de aplausos, lágrimas e abraços. Era como se, naquele instante, Kauan estivesse lá, comemorando com eles.
"Ele adorava futebol, vivia para isso", contou uma tia do adolescente, com a voz embargada. "Ver seus amigos fazendo isso por ele... não tem palavras. É triste, mas ao mesmo tempo nos dá um conforto."
O Vazio que Fica
Enquanto isso, a Polícia Civil trabalha para desvendar o caso. Até o momento, não há informações sobre a origem do disparo ou possíveis suspeitos. Um mistério que só aumenta a angústia da família.
Kauan era aluno do 7º ano do ensino fundamental e, segundo professores, tinha um sorriso que iluminava a sala de aula. "Ele era daqueles alunos que fazem você acreditar que vale a pena ser educador", lembrou uma professora. "Sempre participativo, sempre com uma pergunta inteligente."
O caso reacende o debate sobre a violência urbana e o que andamos fazendo — ou deixando de fazer — para proteger nossas crianças. Quantos Kaukans precisamos perder até que algo mude de verdade?
Enquanto a bola rola novamente no campo do Portal da Alegria, há uma ausência que todos sentem. Mas também há a certeza de que, pelo menos na memória de quem o amou, Kauan continuará marcando gols — os gols mais importantes, aqueles que ninguém pode tirar.