
Eis uma ironia que não passa despercebida nem pelo mais distraído dos observadores. O Pará — campeão absoluto de destruição florestal nos últimos anos — acaba de ser confirmado como anfitrião da COP30, a conferência do clima das Nações Unidas marcada para 2025. Belém, sua capital, vai receber líderes mundiais justamente para discutir... como frear o desmatamento.
Os números não mentem: só em 2023, o estado perdeu área verde equivalente a 300 mil campos de futebol. Uma contradição? Talvez. Mas há quem veja nisso uma jogada de mestre.
Entre a cruz e a espada
"É como colocar um alcoólatra para dar palestras sobre temperança", brinca o ambientalista Carlos Durigan, antes de completar, sério: "Mas pode ser o empurrão que faltava". Ele se refere aos R$ 1,2 bilhão prometidos pelo governo federal para infraestrutura e segurança na região metropolitana de Belém.
Do outro lado, críticos não poupam palavras:
- "Escolha no mínimo curiosa", diz o ex-ministro Rubens Ricupero
- "Sinaliza que o Brasil leva o tema a sério", rebate a governadora Helder Barbalho
- "Vergonha internacional", resumem ativistas no X (antigo Twitter)
Enquanto isso, nas ruas de Belém, o clima é de expectativa — e um tanto de incredulidade. "A gente mal tem saneamento básico direito, e vão trazer esses chefões todos pra cá?", pergunta Mariazinha, dona de um bar na Cidade Velha, enquanto arruma as cadeiras plásticas na calçada.
O que esperar da COP30 na terra do açaí
Especialistas apontam três cenários possíveis:
- Vitrine da devastação: as delegações estrangeiras testemunhariam in loco os efeitos do desmate
- Laboratório de soluções: projetos de bioeconomia ganhariam holofotes globais
- Festa da hipocrisia: discursos bonitos mascarariam a continuidade da destruição
O certo é que, até 2025, todos os holofotes — e cobranças — estarão voltados para o norte do Brasil. Resta saber se o Pará usará essa oportunidade para virar o jogo ou se afundará ainda mais no ranking pouco honroso que hoje ocupa.
Uma coisa é certa: quando os chefes de estado desembarcarem no aeroporto de Val-de-Cans, o cheiro de queimada — literal e figurativo — estará no ar.