
Não é miragem, não. Lá estava ela, uma arara-canindé de porte majestoso, dessas que a gente normalmente só vê voando alto ou em documentários da TV. Só que desta vez, não estava no céu nem na floresta. Estava bem no meio da rua, num bairro residencial de Cuiabá, enfrentando o calorão típico da região como qualquer outro morador.
O termômetro marcava nada menos que 39°C – e olhe que ainda era período da manhã. A cena, capturada em vídeo por um morador que ainda se recupera do susto (e da emoção), mostra o animal claramente extenuado. Quem nunca ficou derretido nesse calor cuiabano, não é mesmo? Pois a ave parecia sentir na pele, ou melhor, nas penas, a mesma coisa.
E então veio o momento que arrancou suspiros: a arara, com uma calma que contrastava com a agonia do calor, aproximou-se de um bebedouro improvisado, desses que gente boa deixa para pets de rua. Com movimentos precisos e quase delicados, começou a beber água. Não era um gole rápido, de quem está com pressa. Era uma hidratação consciente, demorada, como se soubesse perfeitamente da importância daquele líquido precioso.
Um espetáculo da natureza no asfalto
O que mais impressiona, para além da beleza intrínseca do animal, é o simbolismo daquela imagem. Num estado conhecido justamente pelo agronegócio e pelo avanço sobre áreas naturais, ver uma criatura silvestre se valendo de um recurso urbano para sobreviver é... bem, é no mínimo irônico. E profundamente revelador.
Especialistas que viram as imagens – e sim, elas circulam rápido – comentam que episódios assim tendem a ficar mais frequentes. Com a seca se intensificando e as temperaturas batendo recordes ano após ano, os animais são forçados a sair de seus habitats em busca do básico: água e sombra. E acabam encontrando, para o bem ou para o mal, no nosso mundo de cimento.
Não é todo dia que se vê uma cena dessas. A arara-canindé, também conhecida como arara-de-barriga-amarela, é uma espécie que simboliza todo o esplendor do bioma pantaneiro. Vê-la em contexto urbano é, de certa forma, um alerta. Um alerta bonito, é verdade, mas um alerta mesmo assim.
E o que fazer se você se deparar com uma cena assim?
Primeiro: mantenha a calma. A regra de ouro é não tentar aproximar-se ou, pior, tentar alimentar o animal. Deixe que ele faça o que veio fazer – no caso, hidratar-se – e siga seu caminho. A intervenção humana, ainda que bem-intencionada, costuma causar mais estresse do que ajuda.
Segundo: aproveite o privilégio. São momentos raros que a natureza nos oferece, de graça, um espetáculo de resiliência e adaptação. Aquele vídeo, mais do que fofo, é um documento importante sobre os tempos em que vivemos.
E por fim: talvez seja uma boa ideia pensar em colocar uma vasilha com água fresca na sua calçada também. Quem sabe você não ajuda um outro visitante ilustre a passar pelo próximo dia de calor extremo? Afinal, dividir o mundo com outras espécies é, no fundo, uma troca. E que troca maravilhosa.