
Era uma tarde como qualquer outra no interior do Ceará até que o inesperado aconteceu. A enfermeira Maria da Silva (nome fictício para preservar a família), 34 anos, estava a caminho de um atendimento de emergência quando a ambulância em que viajava colidiu brutalmente com um caminhão. O que se seguiu foram 67 dias de uma batalha desigual contra as sequelas do acidente.
Não foi falta de luta. Nem de cuidados. Os melhores especialistas do Hospital Geral de Fortaleza se revezaram em turnos exaustivos. Mas algumas histórias, por mais que a gente queira, não têm final feliz. Na última sexta-feira (15), o coração dessa guerreira da saúde parou de bater.
O acidente que chocou a região
Testemunhas contam que o barulho da colisão foi ouvido a quarteirões de distância. "Parecia um trovão", lembra um comerciante que preferiu não se identificar. A ambulância, que seguia em alta velocidade com a sirene ligada, teria perdido o controle numa curva acentuada da CE-060.
Os socorristas no local enfrentaram uma cena dantesca:
- A enfermeira ficou presa nas ferragens por quase 40 minutos
- Equipes usaram equipamentos pesados para o resgate
- Outros dois profissionais da saúde ficaram feridos, mas já receberam alta
O motorista do caminhão, segundo a Polícia Rodoviária Estadual, não apresentava sinais de embriaguez. "A investigação apura se houve falha mecânica em um dos veículos", revelou um delegado que acompanha o caso.
Uma vida dedicada aos outros
Maria — como era carinhosamente chamada pelos pacientes — deixou um vazio difícil de preencher. Com 12 anos de profissão, era conhecida por ir além do dever. "Ela fazia plantões dobrados sem reclamar quando o hospital estava lotado", conta uma colega de trabalho, com a voz embargada.
Na UTI onde lutou pela vida, os médicos se lembravam de detalhes peculiares:
- Sempre acordava assustada, perguntando pelos pacientes
- Nos raros momentos de lucidez, pedia notícias da equipe
- Até sedada, seu instinto de cuidar permanecia intacto
"Perdemos não só uma profissional exemplar, mas o tipo de pessoa que faz falta neste mundo", desabafou o diretor da unidade de saúde onde trabalhava.
O legado que fica
Enquanto a família prepara o enterro — marcado para esta terça-feira (19) —, colegas organizam uma vaquinha virtual para ajudar com as despesas. Maria deixa dois filhos pequenos e um marido que, segundo vizinhos, "não sabia viver sem ela".
O caso reacendeu o debate sobre a segurança no transporte de profissionais de saúde. Só este ano, o Ceará registrou 14 acidentes envolvendo ambulâncias — três com vítimas fatais. "É preciso urgentemente revisar os protocolos", cobra o Sindicato dos Enfermeiros.
No velório, uma cena sintetizou tudo: dezenas de pessoas vestidas de branco, muitas delas ex-pacientes, formaram uma fila que saía da funerária e dobrou a esquina. Cada uma com uma história de como aquela enfermeira mudou suas vidas. E assim, entre lágrimas e memórias, Fortaleza perdeu um pouco do seu brilho.