A cantora, modelo e compositora clássica Ana Schurmann, natural de Florianópolis, uniu arte e ciência de forma pioneira ao criar, ao lado de pesquisadores brasileiros, o que está sendo chamado de "primeira sinfonia do universo". A obra musical, intitulada The Harmonic Universe (Chirp Symphony), foi concebida a partir da tradução artística de sinais de ondas gravitacionais detectados por observatórios internacionais.
Da física para as teclas do piano
O projeto nasceu da curiosidade inquieta de Ana Schurmann, que se perguntou como seria a música do cosmos. Para encontrar a resposta, ela buscou a colaboração dos físicos Cássius de Melo, professor da Universidade Federal de Alfenas, e Regiley Pimenta, doutorando do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA). Juntos, eles integram a colaboração científica internacional LIGO/Virgo/KAGRA.
Os pesquisadores explicam que as ondas gravitacionais são ondulações minúsculas no tecido do espaço-tempo, causadas por eventos cósmicos cataclísmicos, como a fusão de buracos negros. "É uma vibração tão minúscula que é menor do que um próton", detalha Cássius de Melo, destacando a extrema sensibilidade necessária para detectá-las.
O processo de tradução cósmica
A inovação do grupo foi ir além da simples sonificação, que converte frequências diretamente em som, resultando muitas vezes em ruídos. Eles desenvolveram um método para transformar os dados em música harmônica. O processo seguiu estas etapas:
- Acesso aos dados de ondas gravitacionais de três períodos de observação (2015-2016, 2016-2017 e 2019) do banco aberto da LIGO/Virgo/KAGRA.
- Transformação dos sinais em espectrogramas (representações visuais).
- Identificação do redshift (pico de frequência) de cada evento e sua sonificação.
- Seleção dos eventos mais harmônicos, em ordem cronológica, para formar a base da composição.
- Uso da teoria do campo harmônico para criar acordes e da informação sobre a localização e distância das ondas para definir o momento de entrada de cada acorde na música.
Com a estrutura definida por um algoritmo, coube a Ana Schurmann a interpretação artística. A sinfonia foi lançada em 11 de novembro, com a artista tocando ao piano a composição que nasceu dos segredos do universo.
Uma ponte entre mundos distintos
Para Ana, listada na seleta Under 30 da Forbes Brasil em 2023, o projeto representou um desafio profundo e uma união improvável. "De onde que uma artista manezinha... iria falar com a LIGO/Virgo e com cientistas do ITA?", reflete ela, celebrando a conexão entre a arte pop e a física de ponta.
O trabalho também se configura como uma potente ferramenta de divulgação científica, tornando conceitos complexos e abstratos acessíveis através da experiência sensorial da música. Após a experiência transformadora, Ana Schurmann planeja lançar um álbum inteiro baseado em suas pesquisas científicas, explorando sons que dialogam com a natureza, a dança e o cosmos.