
Parece que o destino resolveu pregar uma peça na Serra da Capivara. Do dia para noite — ou melhor, do voo para o chão — a região que abriga um dos maiores tesouros arqueológicos das Américas ficou isolada do mundo. Literalmente.
A suspensão dos voos comerciais para o aeroporto de São Raimundo Nonato, porta de entrada para o parque, está causando um efeito cascata que ninguém — nem mesmo os mais pessimistas — imaginava que seria tão devastador.
Turismo na UTI
"É como se tivessem fechado a torneira", desabafa Maria do Carmo, dona de pousada há 15 anos. Sua voz tremula ao contar que as reservas caíram 80% desde o anúncio. "A gente virou um destino só para aventureiros dispostos a encarar 8 horas de estrada poeirenta."
Os números assustam:
- Hotéis operando com 20% da capacidade
- Guias turísticos migrando para outras atividades
- Restaurantes fechando as portas antes do horário
Pesquisas em risco
Enquanto isso, nas escavações arqueológicas, a situação não é menos dramática. "Temos equipamentos parados porque os técnicos simplesmente não conseguem chegar", explica o pesquisador Carlos Augusto, mostrando um drone caríssimo encaixotado. "Cada dia sem trabalho é um capítulo da história humana que deixamos de descobrir."
E não pense que é só questão de paciência. Alguns projetos internacionais já ameaçam retirar financiamento — afinal, tempo é dinheiro, e os custos com deslocamentos alternativos estão asfixiando os orçamentos.
O preço do isolamento
No mercado municipal, os agricultores locais fazem as contas amargas. "Antes, os turistas compravam nossos queijos e doces para levar de lembrança", conta seu Zé, enquanto arruma as prateleiras vazias. "Agora, metade da produção vai pro lixo."
O comércio como um todo estima prejuízos na casa dos R$ 3 milhões mensais. Um baque e tanto para uma região que já não nadava em abundância.
E agora?
Enquanto as autoridades discutem — porque discutir elas discutem — soluções paliativas começam a surgir. Algumas pousadas oferecem traslados de Teresina por preços que beiram o suicídio financeiro. Outras investem no turismo virtual, mas convenhamos: ver pinturas rupestres por Zoom é como comer feijoada só pelo cheiro.
O fato é que, sem uma solução rápida, a Serra da Capivara — essa joia da humanidade — corre o risco de se tornar mais uma vítima da nossa incrível capacidade de negligenciar o que temos de mais valioso.