Um novo avanço no tratamento do câncer de próstata em estágio avançado traz esperança, mas também revela desafios significativos de acesso para os pacientes brasileiros. O Pluvicto, medicamento injetável da classe dos radiofármacos, demonstrou resultados positivos em estudos recentes, porém seu alto custo e ausência no Sistema Único de Saúde representam barreiras para a maioria da população.
Resultados promissores em estudo internacional
A farmacêutica suíça Novartis apresentou em outubro, durante o Congresso da Sociedade Europeia de Oncologia Médica em Berlim, os resultados do estudo PSMAddition. A pesquisa de fase 3 mostrou que o Pluvicto reduziu em 28% o risco de progressão ou morte em pacientes com câncer de próstata metastático que ainda são sensíveis à terapia hormonal.
Os dados, publicados na revista científica da sociedade médica, também indicaram uma tendência de prolongamento de vida entre os pacientes tratados com o medicamento. Esta é uma evolução significativa, pois anteriormente o Pluvicto era indicado apenas para pacientes que já haviam passado pela quimioterapia e desenvolvido resistência à castração química.
Mecanismo inovador de ação
O médico Igor Morbeck, especialista em tumores urológicos do Grupo Oncoclínicas, explica como funciona este tratamento revolucionário: "O Pluvicto é como um cavalo de Troia. Trata-se de uma molécula que possui alta afinidade pelo PSMA, um receptor presente na superfície das células cancerosas da próstata. Quando o Pluvicto se liga ao PSMA, ele entra na célula cancerosa e libera uma substância radioativa chamada lutécio, que explode a célula".
Este mecanismo direcionado é eficaz para aproximadamente 80% dos pacientes com câncer de próstata, que são positivos para o PSMA (Antígeno de Membrana Específico da Próstata).
Desafios de acesso no Brasil
A realidade brasileira, no entanto, contrasta com o otimismo dos resultados científicos. Cada dose de 12,5 ml do medicamento pode custar até R$ 145 mil, e o tratamento completo requer seis aplicações, totalizando aproximadamente R$ 870 mil por paciente.
Atualmente, o Pluvicto não está disponível no SUS nem em farmácias comuns. O acesso se dá apenas por meio de clínicas especializadas, hospitais ou planos de saúde. "Os convênios são obrigados a pagar pelo medicamento, mas nem todos cumprem essa obrigação porque o orçamento não permite. Então muitos pacientes recorrem à via judicial para garantir o acesso", relata Morbeck.
Além do custo do medicamento, outro obstáculo é a necessidade do exame PET-PSMA, que detecta a presença da proteína PSMA e garante a eficácia do tratamento. O SUS não dispõe amplamente deste exame nem da infraestrutura de medicina nuclear necessária para aplicações e descarte do material radioativo.
Cenário preocupante do câncer de próstata no Brasil
Os números destacam a urgência de soluções acessíveis. Um levantamento do Instituto Lado a Lado Pela Vida revelou que, dos 44.660 casos de câncer de próstata diagnosticados pelo SUS em 2023, 54% já estavam nos estágios 3 e 4, quando a doença já havia avançado significativamente.
Mais alarmante ainda são os dados da Sociedade Brasileira de Urologia: apenas em 2024, o câncer de próstata matou 48 homens por dia no Brasil, totalizando 17.587 óbitos no período. A doença, que é altamente curável quando identificada precocemente, continua causando milhares de mortes evitáveis.
Lenio Alvarenga, diretor médico da Novartis Brasil, ressalta: "A ciência avança e traz novas opções de tratamento para a fase metastática, mas a cura está ligada à detecção precoce. Mesmo que o medicamento trate uma fase avançada da doença, é fundamental que, como sociedade, a gente faça de tudo para que o paciente não chegue a esse estágio".
A Novartis planeja enviar os novos resultados para as autoridades regulatórias brasileiras até o final deste ano, o que poderá expandir o número de pacientes elegíveis para o tratamento. No entanto, o desafio de incorporar uma terapia de custo tão elevado ao sistema público permanece, exigindo discussões profundas sobre alocação de recursos e prioridades na saúde pública brasileira.