O Ministério da Saúde brasileiro apresentou durante a COP30 um guia inédito com orientações práticas para proteger a população dos efeitos das mudanças climáticas na saúde. O documento, chamado Guia de Mudanças Climáticas e Saúde, surge em um momento crucial, quando os impactos do clima já são realidade no Brasil e no mundo.
Os prejuízos causados por catástrofes naturais somaram mais de R$ 37 bilhões apenas em 2024 no Brasil, sem contar os danos à saúde da população. Globalmente, as perdas ultrapassaram US$ 258 bilhões, segundo levantamentos internacionais citados no guia.
Vulnerabilidades e desigualdades climáticas
O documento dedica atenção especial às populações mais vulneráveis, destacando que as mudanças climáticas não atingem a todos da mesma forma. Comunidades negras, indígenas, ribeirinhas e periféricas, além de mulheres, idosos e pessoas com deficiência, são mais expostas aos efeitos do clima devido às condições territoriais historicamente vulneráveis.
O guia introduz o conceito de racismo ambiental, termo cunhado nos anos 1980 pelo ativista norte-americano Benjamin Franklin Chavis Jr., para descrever como comunidades racializadas sofrem desproporcionalmente com a degradação ambiental. No contexto brasileiro, isso se manifesta em bairros periféricos mais quentes, moradias próximas a córregos poluídos e populações tradicionais afetadas por queimadas e desmatamento.
As mulheres representam 70% das pessoas em extrema pobreza no mundo e estão mais expostas a situações de insegurança alimentar, sobrecarga de trabalho doméstico e violência durante emergências climáticas.
Medidas práticas para diferentes cenários
Calor extremo
As ondas de calor estão entre as emergências climáticas mais graves e silenciosas. A exposição prolongada a altas temperaturas pode levar à exaustão, desmaios e falência de órgãos. Um estudo publicado na revista Temperature estimou que mais de 34 mil pessoas morreram na Índia entre 2001 e 2019 por causas diretamente relacionadas ao calor e ao frio extremos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a cada aumento de 1°C na temperatura mínima diária acima de 23,9°C, o risco de morte infantil cresce até 22%. Gestantes, recém-nascidos, crianças e idosos estão entre os grupos mais vulneráveis.
Medidas de proteção:
- Beber bastante água ao longo do dia, mesmo sem sede
- Usar roupas leves, claras e de tecidos naturais
- Manter ambientes ventilados e evitar atividades entre 10h e 16h
- Dar atenção especial a idosos, crianças e gestantes
- Nunca permanecer em veículos parados sem ventilação
Quedas de temperatura
O frio intenso contrai os vasos sanguíneos, eleva a pressão arterial e aumenta a viscosidade do sangue, sobrecarregando o coração. Isso eleva o risco de infarto, AVC e arritmias, principalmente entre idosos e pessoas com doenças crônicas.
Medidas de proteção:
- Usar roupas em camadas, cobrindo bem mãos, pés e cabeça
- Manter o ambiente aquecido e ventilado
- Evitar banhos frios e exposição prolongada ao ar livre
- Ficar atento a sinais de hipotermia
Poluição do ar
A poluição atmosférica está associada a mais de 8 milhões de mortes anuais no planeta, segundo o guia. No Brasil, os maiores índices de poluição concentram-se nas regiões Sudeste e Norte, onde há maior ocorrência de queimadas e tráfego intenso.
Durante episódios de fumaça intensa, como os registrados na Amazônia e no Centro-Oeste, os níveis de partículas finas podem ultrapassar em até 20 vezes o limite seguro recomendado pela OMS.
Medidas de proteção:
- Usar máscaras PFF2, N95 ou R95 em áreas afetadas por fumaça
- Manter portas e janelas fechadas durante picos de poluição
- Evitar atividades físicas ao ar livre em dias críticos
- Acompanhar os alertas de qualidade do ar
Impactos na saúde mental e justiça climática
O guia também aborda os efeitos psicológicos das mudanças climáticas. Eventos extremos como enchentes não causam apenas danos físicos imediatos, mas também geram sofrimento mental que pode durar meses, com aumento nos casos de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático.
O documento diferencia dois tipos de vulnerabilidade: a intrínseca, ligada a fatores biológicos como idade, gestação, doenças crônicas ou deficiência; e a socialmente produzida, resultado de desigualdades históricas e políticas que expõem determinados grupos a riscos maiores.
Segundo o Ministério da Saúde, adotar a equidade como eixo das políticas de adaptação climática é fundamental para promover a justiça climática e construir respostas justas e sustentáveis para toda a população brasileira.