
Trinta anos. Três décadas inteiras. É tempo suficiente para ver crianças se tornarem adultas, ideias amadurecerem e instituições se transformarem completamente. Foi exatamente esse período que o ministro Luís Roberto Barroso dedicou a conversar com jornalistas, construindo um arquivo impressionante sobre o Supremo Tribunal Federal e o país.
O que começou como entrevistas esparsas nos anos 90 se transformou numa coleção meticulosa que agora vai virar livro. Barroso, sempre tão cuidadoso com as palavras, manteve tudo guardado. Cada conversa, cada declaração, cada momento de reflexão sobre o tribunal mais importante do Brasil.
O espelho do Supremo
O mais fascinante nessa história toda é como essas entrevistas funcionam como um espelho. Não apenas do ministro, mas do próprio STF e, quem diria, do Brasil inteiro. É quase como folhear um álbum de fotografia institucional - você vê as mudanças, as rugas que aparecem, as transformações inevitáveis.
Nos primeiros anos, o Supremo era diferente. Bem diferente. Um tribunal mais discreto, menos no centro dos holofotes. Barroso mesmo reconhece: "O STF era uma corte reativa". E como mudou! Hoje, não tem como negar - a corte está no olho do furacão de praticamente todos os debates importantes do país.
A transformação que ninguém esperava
Quem poderia imaginar, trinta anos atrás, que o Supremo se tornaria... isso? Um tribunal que praticamente dita os rumos do país em questões que vão desde política até moral e costumes. A Constituição de 1988 abriu as portas, mas foram os ministros que decidiram caminhar por elas.
Barroso tem suas teorias sobre essa mudança. Na sua visão, o STF precisou ocupar espaços que outros Poderes abandonaram. É quase como aquela história: a natureza abomina o vácuo. Quando o Executivo e Legislativo falham em suas funções básicas, alguém tem que agir. E o Judiciário acabou sendo esse alguém.
Não é simples, claro. Essa expansão de atribuições gera debates acalorados. Tem quem adore e tem quem deteste. Mas fato é: o STF de hoje não é mais aquele tribunal discreto dos anos 90.
O peso das palavras
O que mais impressiona nessas entrevistas é a evolução do próprio Barroso. Das primeiras declarações mais cautelosas até as análises profundas dos últimos anos, dá para traçar uma linha do tempo do seu pensamento. E, de quebra, do pensamento jurídico brasileiro.
Ele mesmo brinca que algumas respostas antigas hoje lhe causam certa... vergonha? Não exatamente, mas aquela sensição estranha de rever algo que você escreveu muito tempo atrás. Quem nunca?
O interessante é que Barroso nunca fugiu dos temas difíceis. Pelo contrário - parece que quanto mais complexo o assunto, mais ele se anima em discutir. Direitos fundamentais, liberdades individuais, o papel do Estado... temas que parecem saídos de livros de filosofia, mas que na prática afetam a vida de todos nós.
Um retrato do Brasil
No fim das contas, essas três décadas de entrevistas são muito mais que um registro da trajetória de um ministro. São um retrato fiel - e às vezes doloroso - da nossa própria evolução como país.
Os temas que aparecem e desaparecem, as crises que surgem e se resolvem (ou não), as mudanças na sociedade que inevitavelmente chegam às portas do Supremo. Tudo está lá, registrado nas respostas de Barroso ao longo dos anos.
E o que fica claro é que o STF, querendo ou não, tornou-se um ator central na democracia brasileira. Para o bem ou para o mal, não há como discutir: entender o Supremo hoje é entender o Brasil. E essas entrevistas são uma janela privilegiada para ambos.
O livro que está por vir promete ser mais que uma coletânea de falas. Será um documento histórico, um guia para entender como chegamos até aqui. E, quem sabe, para imaginar para onde vamos.