
Não é só terra, carvão e aço. O Donbas é, talvez, o tabuleiro de xadrez geopolítico mais perigoso do planeta neste exato momento. Cada metro quadrado dessa região no leste da Ucrânia carrega o peso de histórias cruzadas, ambições imperiais e um conflito que já dura uma década – mas que explodiu de forma catastrófica para o mundo todo ver.
Ah, e como explodiu. A ofensiva russa de 2022, daquela brutalidade toda, tinha um objetivo claro: garantir o controle sobre Donetsk e Luhansk, as duas repúblicas autoproclamadas que Putin decidiu reconhecer pouco antes dos tanques avançarem. Foi o estopim. O pretexto perfeito, ou pelo menos é isso que Moscou vende.
Uma História que Não é Só História
Para entender a treta toda, tem que voltar no tempo – e não é pouco. A Rússia czarista do século XIX via naquela região uma joia industrial, cheia de recursos minerais. Catarina, a Grande, mandou povoar o lugar. O resultado? Uma população com fortes laços linguísticos e culturais com a Rússia, um vínculo que o tempo não apagou.
Pula para a era soviética. O Donbas vira o coração industrial da USSR, um símbolo do poder operário. A identidade local, é bom que se diga, sempre foi um cocktail complicado: nem totalmente ucraniana, nem completamente russa. Uma coisa híbrida, uma zona cinzenta que agora virou um inferno a céu aberto.
2014: O Ano que Não Terminou
Tudo desandou de vez depois da anexação russa da Crimeia. Foi como um sinal verde para os grupos pró-Rússia em Donetsk e Luhansk. Eles se armaram, declararam independência – obviamente não reconhecida por quase ninguém – e iniciaram um conflito de baixa intensidade que, pasmem, já tinha matado mais de 14 mil pessoas antes de 2022.
O acordo de Minsk, em 2015, foi uma tentativa de botar panos quentes. Uma trégua frágil, cheia de violações de ambos os lados. Basicamente, congelou o conflito, mas não resolveu porra nenhuma. Ficou tudo numa tensão constante, um barril de pólvora prestes a estourar. E estourou.
Por Que Tanto Interesse Nessa Terra?
O valor do Donbas vai muito, mas muito além do sentimentalismo histórico ou da suposta proteção de compatriotas.
- Geografia é Poder: Controlar o Donbas é ter uma espinha dorsal terrestre contínua da Rússia até a Crimeia. É logística pura, meu caro. É abrir um corredor vital para tropas e suprimentos.
- O Fantasma da OTAN: Para o Kremlin, a expansão da aliança ocidental é uma paranoia real. Impedir que a Ucrânia – toda ela – entre na OTAN é objetivo máximo. E ter uma parte do país como zona de conflito permanente é a maneira mais suja de garantir que isso nunca aconteça.
- Economia Sob os Escombros: Ainda que as minas e indústrias estejam detonadas, o potencial de reconstrução é enorme. Quem controlar a região, controla a chave da recuperação econômica do leste ucraniano.
É uma equação perversa: quanto mais a Rússia avança e consolida seu domínio, mais chips ela tem para negociar. E Zelensky se vê num beco quase sem saída – ceder território é trair a soberania do país, mas a pressão por uma solução, qualquer solução, só aumenta.
O Impasse que Ninguém Sabe Como Quebrar
As negociações, quando acontecem, são um jogo de espelhos. De um lado, a Rússia exige o reconhecimento formal da perda da Crimeia e da independência do Donbas. Do outro, a Ucrânia não aceita abrir mão de um centímetro sequer do que considera seu território legítimo.
O mundo observa. E torce. E manda armas. E impõe sanções. Mas no fim, a bola está com os dois líderes encurralados pela sua própria retórica. Uma paz real, duradoura, parece um sonho distante enquanto os canhões não se calam.
Uma coisa é certa: o destino do Donbas vai ecoar por décadas. Não é um conflito local. É a definição de uma nova ordem de poder, e o preço, como sempre, está sendo pago por quem menos pode.