
Era uma daquelas notícias que a gente nunca quer dar — mas a vida, sabe como é, tem seus capítulos tristes. Arlindo Cruz, o poeta do samba que embalou gerações com seus versos cheios de gingado e verdade, partiu. Aos 66 anos, o artista deixou um vazio que nenhum repique de pandeiro vai preencher.
Quem nunca se pegou cantarolando "O show tem que continuar" no chuveiro? Pois é. O cara que compôs esse hino informal da resistência brasileira agora vira memória — das boas, daquelas que não saem da cabeça.
Do pagode à eternidade
Nascido no Rio — porque samba mesmo só podia vir daquela cidade maravilhosa — Arlindo começou cedo. Aos 14 anos já mostrava que tinha dendê nas veias. Fundador do Fundo de Quintal, grupo que revolucionou o pagode nos anos 80, ele carregava na voz a essência das rodas de samba de verdade.
E olha que o homem não parou por aí:
- Mais de 20 discos lançados
- Parcerias com monstros sagrados como Zeca Pagodinho
- Prêmios que nem cabem na estante
- E o principal: o amor do povo
Não era só música — era identidade cultural em forma de canção.
"O samba é minha vida"
Ele dizia isso sempre. E dava pra ver. Nos shows, o sujeito transformava — os olhos brilhavam, as mãos desenhavam no ar os compassos, o corpo todo virava instrumento. Arlindo não interpretava samba, ele era o samba.
Nos últimos anos, a saúde do artista deu sinais de cansaço. Problemas neurológicos o afastaram dos palcos, mas nunca do coração do público. Até porque — convenhamos — música como a dele não tem data de validade.
O velório deve acontecer no Rio, claro. Ainda não confirmaram se vai ser no Cacique de Ramos, terreiro sagrado onde tudo começou. Seria justo — afinal, a história sempre dá voltas redondas como um bom samba-enredo.
Enquanto isso, nas ruas do subúrbio carioca, nos bares, nas festas de fundo de quintal, o pandeiro vai continuar tocando. Mais abafado talvez, com um luto discreto nas cordas do cavaquinho. Mas como ele mesmo ensinou: o show tem que continuar.