A prisão de um youtuber norte-americano por suspeita de aliciamento e exploração sexual de menores no Rio de Janeiro teve início com a desconfiança de um motorista de aplicativo. O caso, que envolve investigações internacionais, revela um padrão de ações criminosas coordenadas através de serviços de transporte por celular.
Denúncia que desencadeou a investigação
Tudo começou no dia 8 de dezembro, quando um motorista recebeu uma solicitação de corrida no bairro do Jacaré, Zona Norte do Rio. O usuário estava cadastrado como “Terry William”. Ao chegar ao local, o condutor percebeu que os passageiros eram duas meninas menores de idade.
Durante o trajeto, as adolescentes revelaram que estavam sendo levadas para encontrar um homem mais velho, estrangeiro, que não falava português. Elas não souberam explicar claramente a identidade do homem ou o destino final, o que acendeu o alerta do motorista. Ele registrou a situação como de risco e acionou o suporte da empresa de transporte.
Padrão criminoso descoberto pela Uber
Após a denúncia, a Uber iniciou uma apuração interna. A investigação da empresa identificou que o mesmo usuário havia criado e utilizado diversas contas com nomes fictícios ou de terceiros. A análise revelou um padrão de corridas solicitadas para transportar crianças e adolescentes, principalmente meninas, em diferentes regiões do Rio.
Em muitos casos, o solicitante não estava presente no local de embarque e coordenava as viagens à distância. Em outro episódio flagrante, em 18 de dezembro de 2025, uma corrida do mesmo perfil transportou quatro adolescentes, todas com menos de 18 anos, do bairro da Rocha, na Zona Norte, para Santo Cristo, no Centro do Rio.
O relatório completo da empresa foi encaminhado ao Ciberlab, do Ministério da Justiça, que repassou as informações à Polícia Civil do Rio de Janeiro.
Cruzamento de dados e identificação do suspeito
Com o apoio da Homeland Security Investigations (HSI), agência de segurança interna dos Estados Unidos, o cruzamento de dados permitiu identificar que “Terry William” era, na verdade, o norte-americano Floyd L. Wallace Jr..
As autoridades mapearam um padrão repetido de deslocamentos, com grande concentração de corridas em regiões próximas a comunidades, hotéis e imóveis usados como hospedagem temporária.
Durante o monitoramento, os investigadores constataram que Wallace usava múltiplos perfis digitais, e-mails e identidades falsas. Ele apagava e recriava contas com frequência para dificultar o rastreamento.
Perfil digital e declarações incriminatórias
A polícia identificou manifestações públicas do próprio investigado em redes sociais e transmissões ao vivo. Nelas, ele se autodeclarava praticante de turismo sexual, usando expressões como “turista sexual” e “passport bro”.
O delegado Cristiano Maia, da Delegacia de Crimes contra a Criança e o Adolescente Vítima (DCAV), explicou: “Nós começamos a vasculhar a vida desse indivíduo. Descobrimos que ele se autodeclara 'passaporte bro', que é um termo para turismo sexual”.
Wallace afirmava em publicações que viajava para países mais pobres com o objetivo exclusivo de manter relações sexuais, rejeitando vínculos afetivos e demonstrando conhecimento dos riscos legais.
Prisão em São Paulo e material apreendido
No último sábado, dia 20, os investigadores descobriram que Wallace havia deixado o Rio e se deslocado para São Paulo. Com indícios de que ele poderia fugir do país, a Polícia Civil pediu à Justiça a prisão temporária.
A prisão ocorreu no bairro da Liberdade, em São Paulo, durante uma operação conjunta das polícias civis do Rio e de São Paulo. O investigado ofereceu resistência no momento da abordagem.
Durante a ação, foram apreendidos:
- Dispositivos eletrônicos (pen drives, cartões de memória, notebook e celulares)
- Objetos como bichos de pelúcia e relógios
- Um relógio com câmera escondida
O delegado Cristiano Maia detalhou: “Na residência onde ele estava, nós encontramos bichinhos de pelúcia, câmeras escondidas em aparelhos eletrônicos, touca ninja... Tanto é que ele foi preso em flagrante, além do mandado de prisão, por produção e armazenamento de conteúdo pornográfico infantil”.
Crimes investigados e histórico do acusado
Floyd L. Wallace Jr. é investigado pelos crimes de estupro de vulnerável e favorecimento à exploração sexual infantil. As penas somadas podem chegar a 34 anos de prisão.
Conhecido nos Estados Unidos por confrontos com a polícia, Wallace já acumulou passagens criminais em mais de 13 estados americanos antes de se tornar alvo de investigação por crimes sexuais no Brasil.
As investigações continuam em andamento para identificar vítimas, possíveis cúmplices e verificar se há ligação com crimes semelhantes cometidos fora do Brasil.