O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) formou maioria para homologar um Termo de Compromisso de Cessação (TCC) com a Apple, encerrando uma investigação por práticas anticompetitivas. O acordo, considerado pioneiro globalmente, obriga a gigante da tecnologia a abrir seu ecossistema no Brasil.
O que muda para desenvolvedores e usuários
As novas regras representam uma ruptura significativa no modelo de negócios da App Store no país. A Apple se comprometeu a permitir o download de aplicativos de lojas alternativas autorizadas, rompendo o monopólio de sua plataforma oficial.
No campo dos pagamentos, a mudança é profunda. A empresa deixará de vincular obrigatoriamente as transações ao seu próprio sistema. Desenvolvedores poderão integrar métodos de pagamento alternativos diretamente em seus apps, assumindo a interface de pagamento se desejarem.
O texto do acordo cita explicitamente o Pix como uma das opções possíveis, reconhecendo sua ampla adoção no Brasil e a supervisão do Banco Central. Além disso, aplicativos poderão exibir links ou botões que direcionem o usuário para compras em sites externos, prática antes proibida.
Nova estrutura de comissões e salvaguardas
O modelo de taxas também foi reformulado. No esquema tradicional, a Apple cobrava 30% sobre as transações. Com o TCC, as comissões serão desagregadas: 25% para grandes desenvolvedores e 10% para pequenas empresas enquadradas em um programa específico da companhia.
Para garantir segurança e transparência, o acordo autoriza a Apple a exibir telas de aviso informando que uma transação será gerenciada pelo desenvolvedor, e não por ela. O Cade, porém, determinou que esses alertas usem linguagem neutra e objetiva, sem criar fricções desnecessárias que possam desencorajar o consumidor.
Um acordo inédito com prazos e multas
O conselheiro do Cade e relator do caso, Victor Oliveira Fernandes, destacou o caráter histórico da medida. "A partir da presente decisão, o Brasil passará a ocupar posição inédita no panorama global, figurando como a única jurisdição em que a Apple será instada a promover a abertura de seu ecossistema móvel com fundamento exclusivo na aplicação da legislação antitruste", afirmou.
O acordo terá vigência de três anos e prevê um período de transição de 120 dias para implementação. O cumprimento das obrigações será monitorado por um interventor independente. O descumprimento integral pode resultar em multa de até R$ 150 milhões.
A Apple, em nota, manifestou preocupação com as mudanças. A empresa afirmou que baixar apps fora de sua loja oficial cria novos riscos e que está fazendo ajustes que impactarão os aplicativos do iOS no Brasil. "Embora essas mudanças abram novos riscos à privacidade e à segurança dos usuários, trabalhamos para manter proteções", disse, citando salvaguardas para usuários mais jovens.
A companhia argumenta que, diferentemente da Europa – onde regras semelhantes foram impostas pelo Digital Markets Act –, o acordo brasileiro permite que ela adote mais ações para proteger os usuários, especialmente crianças e dados sensíveis.
A investigação que levou ao acordo teve origem em uma denúncia do Mercado Livre em 2023. A plataforma questionava a obrigatoriedade do uso do sistema de pagamentos da Apple e o impedimento de desenvolvedores informarem usuários sobre opções de compra mais baratas fora da App Store.