Tilápia na lista de invasoras: entenda a polêmica
A decisão da Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio) de incluir a tilápia na Lista Nacional Oficial de Espécies Exóticas Invasoras gerou alerta entre produtores e divergências dentro do próprio governo federal. A medida, anunciada em junho de 2024, classifica a tilápia-do-nilo como espécie exótica invasora, mas não proíbe seu cultivo ou consumo no país.
O que significa ser espécie exótica invasora?
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, uma espécie é considerada invasora quando aparece em habitats onde não é nativa, causando desequilíbrios ambientais. No caso da tilápia, originária do continente africano, sua presença em rios brasileiros fora das áreas de produção preocupa especialistas.
O professor Jean Vitule, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), especialista no tema, explica que a tilápia possui características que a tornam uma ameaça para ecossistemas onde não é nativa:
Comportamento territorialista: compete com espécies nativas por espaço e recursos.
Alimentação variada: sendo onívora, consome desde plantas até outros peixes.
Alterações no ecossistema: modifica a quantidade de nutrientes e produtividade dos lagos.
Grande resistência: adapta-se até mesmo à água salgada, como comprovado em estudo do próprio Vitule.
Impactos para os produtores
O setor produtivo manifesta preocupação com possíveis consequências práticas da decisão. Jairo Gund, diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Pescado (Abipesca), alerta para insegurança jurídica e possíveis barreiras à exportação.
Juliana Lopes da Silva, diretora do Departamento de Aquicultura em Águas da União, enumera os principais temores do setor:
Aumento de custos no licenciamento ambiental
Atrasos na abertura de novos mercados internacionais
Dificuldades burocráticas para obtenção de licenças
Insegurança jurídica pela falta de legislação específica
Divergências no governo
O tema não consenso entre os ministérios. Enquanto o Meio Ambiente defende a inclusão com base em 247 estudos científicos analisados, os ministérios da Agricultura e da Pesca e Aquicultura se posicionam contra a medida.
O Ministério da Pesca prepara um parecer técnico solicitando a retirada da tilápia da lista. "Estarem na lista a tilápia e o javali é desproporcional", argumenta Juliana Silva.
Medidas de controle e escapes
Atualmente, os produtores utilizam sistemas como tanque-rede e viveiro escavado para conter os peixes. Uma das principais estratégias é a reversão sexual para produzir principalmente machos, reduzindo o risco de reprodução na natureza.
Porém, como explica Jean Vitule, "mesmo que eu faça um tanque 100% seguro, vai acontecer o que aconteceu, por exemplo, no Rio Grande do Sul, na cheia do ano passado. Escaparam milhares de tilápias". Eventos climáticos extremos aumentam significativamente as fugas.
O Ministério do Meio Ambiente reforça que a inclusão na lista não significa proibição do cultivo, mas serve como referência para políticas públicas de prevenção e controle ambiental. O Ibama continua responsável por autorizar a criação da espécie no país.