O Ministério Público Federal (MPF) emitiu uma recomendação para suspender a análise de licenciamento ambiental de dois grandes projetos de mineração de terras raras no Sul de Minas Gerais. A decisão afeta os projetos Colossus e Caldeira, que juntos representam um investimento de R$ 1,1 bilhão na região.
Projetos em análise pelo Copam
Os dois empreendimentos minerários estavam com votação marcada para sexta-feira (28) no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). O projeto Colossus é desenvolvido pela empresa Viridis em Poços de Caldas, enquanto o Caldeira é operado pela mineradora Meteoric no município de Caldas.
Ambas as iniciativas foram classificadas como empreendimentos de classe 6, o nível mais alto de potencial poluidor segundo a legislação ambiental. Cada projeto prevê a movimentação e processamento químico de 5 milhões de toneladas de argila por ano, utilizando a técnica de lixiviação ácida.
Princípio da precaução
O MPF fundamentou sua recomendação no princípio da precaução, que exige medidas preventivas contra danos ambientais graves quando o conhecimento científico sobre os impactos ainda é limitado. O órgão alegou que são necessários estudos e consultas complementares para tratar dos riscos ambientais e sociais pendentes.
Uma das principais preocupações do núcleo ambiental do MPF é a proximidade do projeto Caldeira com a Unidade de Descomissionamento de Caldas (UDC) das Indústrias Nucleares do Brasil (INB), que armazena rejeitos e materiais radioativos. O MPF solicitou que a Feam exija manifestação da INB e da Autoridade Nacional de Segurança Nuclear sobre os riscos decorrentes da movimentação de argila e veículos pesados nas proximidades da área nuclear.
Preocupações específicas sobre o projeto Caldeira
O MPF apontou várias questões críticas sobre o projeto da Meteoric:
- Risco de que o processo de lixiviação química possa capturar metais pesados como tório e urânio, gerando rejeitos radioativos
- Falta de consulta livre, prévia e informada às comunidades indígenas e quilombolas da região, violando a Convenção 169 da OIT
- Localização do projeto incluindo parte da Área de Proteção Ambiental Santuário Ecológico da Pedra Branca
Riscos do projeto Colossus
Já o projeto Colossus, da Viridis, preocupa pelo seu impacto potencial sobre os recursos hídricos:
- Área de mineração situada na zona de recarga do Aquífero Alcalino de Poços de Caldas
- Risco de contaminação das águas subterrâneas por nitrato proveniente do processamento da argila
- Ausência de estudos de impacto regional sobre o recurso hídrico
- Proximidade de apenas 300 metros de um hospital e 50 metros de bairros residenciais
- Localização dentro da Área de Segurança Aeroportuária do Aeroporto de Poços de Caldas
Licenciamento fragmentado
O MPF argumentou que o licenciamento ambiental fragmentado, focado em projetos individuais, é insuficiente para tratar dos impactos cumulativos e sinérgicos na região, que tem múltiplos projetos de mineração. Por isso, o órgão solicitou que a Feam exija uma Avaliação Ambiental Estratégica ou Avaliação Ambiental Integrada para o Planalto de Poços de Caldas.
A região é considerada sensível ambientalmente por abranger ecossistemas e corpos hídricos interconectados a bacias hidrográficas interestaduais e integrar o bioma Mata Atlântica.
Posicionamento das empresas
A Meteoric informou que foi notificada sobre a recomendação do MPF e está preparando resposta para cada um dos temas levantados. A empresa defende que o processo de licenciamento ambiental seja claro e transparente, reforçando que está seguindo rigorosamente os requisitos estabelecidos pelas legislações federal, municipal e estadual.
Já a Viridis afirmou que o processo de licenciamento do Projeto Colossus vem sendo conduzido em conformidade com a legislação vigente. A empresa destacou que seu Estudo de Impacto Ambiental foi elaborado por equipes multidisciplinares qualificadas seguindo metodologias reconhecidas nacional e internacionalmente.
Contexto das terras raras
O Brasil possui a segunda maior reserva de terras raras do mundo, com 21 milhões de toneladas, equivalentes a 23% do total global. O depósito localizado no Planalto de Poços de Caldas se destaca pela extensão e alta concentração destes minérios estratégicos, com estimativas de que possa suprir cerca de 20% da demanda global.
A Agência Nacional de Mineração já concedeu 1.882 autorizações para pesquisa de terras raras no Brasil até o início de 2025. Em Minas Gerais, foram 361 pedidos, com cerca de um terço concentrado na região de Poços de Caldas.
Esta não é a primeira vez que o licenciamento desses projetos é adiado. Em outubro, o Copam já havia postergado a análise após pedido de vista conjunta de conselheiros representantes de várias entidades ambientais e empresariais.