Supersalários públicos: R$ 4,5 bi acima do teto em 5 anos, aponta estudo
Supersalários públicos: R$ 4,5 bi acima do teto

Um estudo divulgado nesta segunda-feira (15) expôs um sistema de remuneração que permite a servidores públicos federais receberem valores muito acima do limite legal. A pesquisa, realizada pelo Movimento Pessoas à Frente e pela Transparência Brasil, revela que integrantes de carreiras da Advocacia-Geral da União (AGU) acumularam R$ 4,5 bilhões em pagamentos acima do teto constitucional entre janeiro de 2020 e agosto de 2025.

O que são os supersalários e como funcionam?

O teto constitucional estabelece que nenhum servidor público pode ganhar mais que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), cujo vencimento atual é de R$ 46.366,19. Para contornar essa regra, conhecida como "fura-teto", carreiras do Ministério Público, do Judiciário e, conforme o estudo, também da AGU, utilizam um mecanismo específico.

Esse mecanismo consiste no pagamento de verbas indenizatórias, os chamados "penduricalhos", que não são computados no cálculo do limite remuneratório. No caso dos advogados públicos, a fonte desses valores extras são os honorários de sucumbência, quantias pagas pela parte que perde uma ação judicial.

"O Conselho Curador utiliza as mesmas táticas do Ministério Público e do Judiciário para institucionalizar a inobservância ao teto constitucional, com a criação de penduricalhos sob a roupagem indenizatória ou retroativa", afirma Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil.

Os números bilionários dos penduricalhos

Os dados do estudo "Teto decorativo: impacto orçamentário dos honorários de sucumbência em âmbito federal" são impactantes. Apenas no período de janeiro a agosto de 2025, o valor pago a 11,7 mil advogados em valores que extrapolaram o teto somou R$ 3,8 bilhões.

A prática se tornou massiva a partir de 2022. Enquanto em 2020 apenas 1% dos servidores ativos beneficiados receberam acima do teto, em 2022 esse percentual saltou para 99%. Desde então, nunca ficou abaixo de 92%. O valor total pago acima do limite para ativos disparou de R$ 452,3 mil em 2020 para R$ 3,5 bilhões em 2025 (até agosto).

Entre os servidores inativos, a situação é ainda mais uniforme: 99,7% receberam acima do teto em 2025. O montante pago a esse grupo pelo Conselho Curador dos Honorários Advocatícios (CCHA) foi de R$ 490,1 mil em 2020 para R$ 358,1 milhões em 2025.

Impacto orçamentário e quebra de confiança

O estudo aponta que, para driblar decisões do STF e do Tribunal de Contas da União (TCU) que determinavam a inclusão dos honorários no cálculo do teto, o CCHA criou diversos benefícios acessórios. Entre eles estão auxílio-saúde complementar e auxílio-alimentação complementar.

"O gasto bilionário com supersalários impacta negativamente o orçamento público, amplia a desigualdade remuneratória no serviço público e tem efeito desmoralizante na legitimidade do Estado", avalia Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente.

Além disso, o levantamento mostrou que o CCHA tem descumprido a legislação que exige uma quarentena de um ano para o pagamento dos honorários. Desde janeiro de 2024, 435 novos advogados receberam R$ 15 milhões em penduricalhos antes de completarem um ano de exercício.

O g1 procurou a AGU e o Conselho Curador dos Honorários Advocatícios (CCHA) para se manifestar sobre as acusações e aguarda retorno.