
Parece até roteiro de filme de espionagem, mas é a realidade nua e crua que Maria Corina Machado vive há anos. A opositora venezuelana, que já foi deputada e candidata presidencial, hoje navega pelas sombras — uma verdadeira fuga contra o tempo em um jogo onde as regras são ditadas pelo regime de Nicolás Maduro.
E pensar que tudo poderia ter sido diferente. A vida dela mudou radicalmente depois daquela sexta-feira, 10 de outubro de 2025, quando agentes do SEBIN — a temida polícia política — a detiveram por algumas horas que pareceram eternas. Foi uma prisão-relâmpago, daquelas que deixam marcas profundas. Mas diferente do que muitos imaginam, não foi a primeira vez que ela sentiu o peso do Estado venezuelano em seu pescoço.
Uma existência dividida em dois mundos
O que significa viver escondida? Para Maria Corina, tornou-se uma rotina quase banal — se é que se pode chamar de banal trocar de carro constantemente, evitar lugares públicos e nunca dormir duas noites seguidas no mesmo endereço. Ela mesma admitiu, em raras declarações, que precisa "tomar medidas extremas de segurança" só para continuar respirando.
E não é para menos. Os ataques contra ela são múltiplos e vêm de todas as direções:
- Aquela condenação judicial de 15 anos que a impede de concorrer a qualquer cargo público — uma manobra clássica de regimes autoritários
- As constantes ameaças veladas que chegam através de canais não oficiais
- O assédio digital que transformou suas redes sociais em campos minados
- A perseguição política que atingiu não só ela, mas todos ao seu redor
Não me surpreende que ela tenha desenvolvido uma espécie de sexto sentido para o perigo. Quem vive sob constante pressão acaba aprendendo a ler nas entrelinhas.
O preço da resistência
O que mais me impressiona, confesso, é a resiliência quase sobrenatural dessa mulher. Mesmo com a candidatura barrada — uma decisão que muitos analistas internacionais classificaram como "grosseiramente antidemocrática" — ela continua mobilizando multidões. Suas aparições públicas, embora raras, são calculadas com a precisão de um relojoeiro suíço.
E o movimento que ela representa? Bem, é como tentar apagar um incêndio com gasolina. A cada repressão, mais pessoas aparecem nas ruas. A cada ameaça, mais vozes se somam ao coro de insatisfação. A situação na Venezuela já era complicada, mas a perseguição a figuras como Machado só joga lenha na fogueira.
Não sou especialista em política internacional, mas até um leigo consegue ver o padrão: quando você tenta calar alguém com força excessiva, geralmente está dando um tiro no próprio pé.
Um jogo de xadrez com peças vivas
A estratégia do governo venezuelano parece seguir um manual antigo — o mesmo usado por tantos regimes antes deles. Primeiro, criminaliza a oposição. Depois, usa o aparato estatal para perseguir dissidentes. Por fim, tenta normalizar a anormalidade até que as pessoas se acostumem com o absurdo.
Mas Maria Corina Machado não é uma peça qualquer nesse tabuleiro. Ela se tornou um símbolo — talvez o símbolo mais visível da resistência democrática na Venezuela atual. E símbolos, como sabemos, são difíceis de eliminar. Podem até ser temporariamente silenciados, mas sua ressonância permanece.
O que vem pela frente? Difícil prever. A situação política na Venezuela é mais instável do que barraca de praia em dia de temporal. Mas uma coisa é certa: enquanto houver vozes como a de Machado — mesmo abafadas, mesmo ameaçadas — a esperança de mudança continuará viva.
E no fim das contas, é isso que mais importa, não é mesmo? A capacidade humana de resistir mesmo quando tudo parece perdido. A teimosia de seguir em frente quando o caminho está cheio de espinhos. Maria Corina Machado personifica essa teimosia — e talvez seja exatamente isso que mais preocupa aqueles que tentam calá-la.