Um grave episódio envolvendo a conservação das ararinhas-azuis mobiliza ambientalistas e autoridades no Brasil. Onze aves da espécie Cyanopsitta spixii, considerada extinta na natureza, testaram positivo para o circovírus, agente causador da doença do bico e das penas.
Falhas críticas em protocolos de biossegurança
As investigações do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) revelaram descumprimento de medidas básicas de biossegurança no Criadouro para Fins Conservacionistas do Programa de Reintrodução da Ararinha-Azul em Curaçá, na Bahia. Entre as irregularidades identificadas estavam limpeza inadequada das instalações e uso irregular de equipamentos de proteção por funcionários.
Cláudia Sacramento, coordenadora da Coordenação de Emergências Climáticas e Epizootias do ICMBio, foi enfática ao afirmar: "Se as medidas de biossegurança tivessem sido atendidas com o rigor necessário e implementadas da forma correta, talvez a gente não tivesse saído de apenas um animal positivo para 11 indivíduos positivos para circovírus".
Multas e consequências
As fiscalizações realizadas em parceria com o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) e a Polícia Federal resultaram em penalidades severas. A instituição foi autuada em cerca de R$ 1,8 milhão pelo ICMBio, enquanto o Inema já havia aplicado multa adicional de aproximadamente R$ 300 mil.
As ararinhas afetadas haviam sido repatriadas da Europa e integravam o programa de reintrodução na Caatinga baiana. Elas foram soltas em 2022, mas precisaram ser recapturadas no início de novembro após a detecção inicial do vírus em maio.
Impacto no programa de conservação
A situação representa um duro golpe para os esforços de preservação da ararinha-azul. A reintrodução da espécie na Caatinga depende fortemente do manejo ex situ, já que a população mantida sob cuidados humanos é, até o momento, a única considerada viável.
O ICMBio já instaurou o Sistema de Comando de Incidente para gerir a emergência e evitar a disseminação da doença entre ararinhas e outros psitacídeos da região. O próximo passo inclui isolar os animais positivos e negativos, garantindo a adoção reforçada de protocolos de biossegurança.
Vale ressaltar que o circovírus, de origem australiana, afeta psitacídeos como araras, papagaios e periquitos, não tem cura e é fatal na maior parte dos casos. A doença não oferece risco a humanos nem a aves de produção.
O acordo de cooperação entre ICMBio e a Associação para Conservação de Papagaios Ameaçados (ACTP), que possibilitou a transferência de 93 aves ao Brasil, foi encerrado em 2024 devido a descumprimentos da ACTP - incluindo a venda e transferência, sem consentimento do governo brasileiro, de 26 ararinhas para a Índia.
O objetivo central do programa permanece o mesmo: reestabelecer uma população saudável e estável em seu habitat natural, nas unidades de conservação de Curaçá (BA), como a APA e o Revis da Ararinha-Azul.