Um relatório científico de alto impacto publicado na última quinta-feira (18) no European Heart Journal, periódico oficial da Sociedade Europeia de Cardiologia, emite um alerta contundente: a nicotina é uma toxina direta para o coração e os vasos sanguíneos, independentemente da forma como é consumida.
Um consenso contra todos os produtos com nicotina
Elaborado por especialistas de universidades da Alemanha, Itália, Estados Unidos e Reino Unido, o documento é descrito como o primeiro consenso a considerar explicitamente os danos de todos os produtos que contêm nicotina, incluindo cigarros eletrônicos (vapes), tabaco aquecido, sachês e o cigarro tradicional. O objetivo é servir como um roteiro político para legisladores e agências de saúde pública.
Os autores destacam com preocupação o aumento no uso de vapes e sachês, particularmente entre adolescentes e jovens adultos em todo o mundo. Eles descrevem esses dispositivos como uma "rampa de acesso de alta velocidade para a dependência", que em poucos anos reverteu décadas de avanço nas políticas de controle do tabagismo tradicional.
Os mecanismos de dano e o cenário brasileiro
O relatório detalha como a nicotina causa estrago no sistema cardiovascular. A substância provoca disfunção endotelial, um marcador precoce de dano vascular, através de estresse oxidativo e inflamação. Além disso, ativa o sistema nervoso simpático, elevando a frequência cardíaca e a pressão arterial.
O uso crônico está ligado ao desenvolvimento de hipertensão, arritmias, remodelamento cardíaco e efeitos pró-trombóticos, que aumentam o risco de infarto e Acidente Vascular Cerebral (AVC).
No Brasil, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) manteve em 2024 a proibição da comercialização, importação e propaganda de Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs). A medida contrasta com um dado alarmante: o país registrou no mesmo ano o primeiro aumento na prevalência de fumantes adultos desde 2007, passando de 9,3% para 11,6%.
Em entrevista, a secretária-executiva da Conicq, Vera Luiza da Costa e Silva, creditou esse crescimento à tributação defasada do cigarro tradicional e à força dos cigarros eletrônicos no mercado.
Recomendações urgentes e custo econômico
Diante do cenário, os pesquisadores fazem uma série de recomendações urgentes para frear o que consideram um momento crítico de regulamentação:
- Proibição do uso de sabores em produtos com nicotina.
- Controles rigorosos sobre vendas online e proibição de publicidade em mídias sociais.
- Tributação proporcional à quantidade de nicotina.
- Proibições abrangentes de fumar e vaporizar em ambientes internos e externos.
- Integração da prevenção ao uso de nicotina na rotina dos cardiologistas.
O documento também chama a atenção para o alto custo econômico do tabagismo. Uma reportagem mostrou que se o Brasil reduzisse a prevalência de fumantes em apenas um ponto percentual, economizaria R$ 24,8 bilhões anuais em custos diretos e indiretos relacionados à saúde e à perda de produtividade.
O relatório conclui com um apelo unificado: é preciso que os legisladores decretem regulamentações decisivas para proteger a saúde cardiovascular das gerações atuais e futuras de uma toxina que se apresenta em novas e sedutoras embalagens.