O governo Lula e aliados no Congresso avaliaram como um erro estratégico da oposição a tentativa de reduzir as competências da Polícia Federal no relatório inicial do projeto de lei antifacção. A manobra, liderada pelo deputado Guilherme Derrite (PP-SP), acabou por fortalecer a posição do Planalto em meio à crise de segurança pública.
O revés que virou vantagem
A escolha de Derrite como relator do projeto na sexta-feira (7) representou inicialmente um revés para o governo federal. O parlamentar, que é secretário de Segurança do governo Tarcísio de Freitas em São Paulo, apresentou horas depois uma versão preliminar com mudanças substanciais no texto original do Executivo.
Entre as alterações mais polêmicas estava a possibilidade de equiparar facções criminosas a grupos terroristas e, principalmente, o esvaziamento das competências da PF no combate ao crime organizado. Esta última medida gerou imediatas críticas de membros do governo, sociedade civil, entidades representativas e especialistas em segurança pública.
Estratégia de contra-ataque do Planalto
Diante da repercussão negativa, o Palácio do Planalto organizou uma resposta coordenada. Integrantes do governo foram orientados a se posicionarem publicamente contra o texto de Derrite, enquanto a Secom (Secretaria de Comunicação Social) da Presidência produziu e divulgou vídeos explicativos nas redes sociais.
Segundo avaliação de aliados do governo, a defesa da Polícia Federal era um tema com amplo respaldo popular e de fácil compreensão para a população. O governo centrou esforços em associar o parecer de Derrite à PEC da Blindagem, que havia sido aprovada na Câmara mas enterrada pelo Senado após forte pressão pública.
Vídeos apócrifos produzidos com inteligência artificial e críticos ao texto do relator começaram a circular nas redes sociais, mostrando homens celebrando as mudanças enquanto comiam lagostas e bebiam vinho, em clara alusão à proteção que políticos e empresários teriam com a redução das atribuições da PF.
Recuo estratégico e consequências políticas
Na tarde desta terça-feira (11), Derrite anunciou o recuo nos dois pontos considerados problemáticos pelo governo, incluindo as mudanças nas competências da Polícia Federal. O anúncio foi feito ao lado do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e celebrado por governistas.
Questionado se as alterações atendiam ao governo, Derrite afirmou que atendiam à população e negou ter sido procurado pela gestão petista. "Isso não é recuo, isso é estratégia", declarou o parlamentar.
Aliados de Motta reconheceram que a indicação de Derrite como relator foi arriscada, mas necessária para que o presidente da Câmara demonstrasse independência em um momento em que vinha sendo criticado internamente por sua aproximação com o Planalto.
Há uma avaliação entre auxiliares de Lula de que o governo saiu vitorioso desta disputa política, conseguindo frear os desgastes que vinha sofrendo e influenciar o debate público. O recuo de Derrite também teria consequências na imagem do governador Tarcísio de Freitas e entre integrantes do Congresso Nacional.
Próximos passos e cautela
Apesar da vitória política, governistas pregam cautela e destacam a necessidade de acompanhar a votação do projeto, prevista para esta quarta-feira (12). A oposição deve tentar incluir novamente a equiparação entre terrorismo e facções criminosas durante a discussão em plenário.
Aliados de Motta reconhecem que houve algum desgaste na imagem do presidente da Câmara, mas avaliam que, se o texto for aprovado, a medida será incorporada ao seu legado à frente da Casa. Eles defendem que o debate entre parlamentares em torno de um texto é natural e faz parte do processo legislativo.
Derrite, por outro lado, ampliou sua exposição pública em um momento em que é lembrado como candidato ao Senado ou ao Governo de São Paulo no ano que vem. O secretário foi defendido por Motta e líderes partidários como uma pessoa técnica que não usou o projeto como palanque eleitoral - visão oposta à do governo, que vê a tramitação do texto contaminada pelas eleições.