O Senado Federal está mobilizado para votar, ainda antes do recesso parlamentar, um projeto de lei que estabelece novas regras para processos de crime de responsabilidade contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e outras altas autoridades. A medida é uma reação direta à recente decisão do ministro Gilmar Mendes, que dificultou o afastamento dos magistrados da Corte.
O que propõe o projeto de lei
A proposta, apresentada em 2023 pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) com base em minuta elaborada pela equipe do então ministro do STF Ricardo Lewandowski, busca atualizar a legislação de 1950. O texto ficou parado desde agosto do ano passado devido a pontos polêmicos, mas agora foi retomado pela cúpula da Casa.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), já conversou com o relator da matéria, senador Weverton Rocha (PDT-MA), para que o parecer seja apresentado em breve. A expectativa é que a proposta seja debatida na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) já na próxima semana.
Principais pontos e polêmicas
O projeto traz mudanças significativas. Amplia o rol de autoridades que podem ser processadas por crime de responsabilidade, incluindo juízes, desembargadores e membros do Ministério Público. Outra alteração importante é a imposição de um prazo para que o presidente da Câmara dos Deputados decida se aceita ou não uma denúncia contra o presidente da República, impedindo que o processo fique engavetado indefinidamente.
Um dos pontos mais controversos é a possibilidade de partidos políticos, sindicatos e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) apresentarem denúncias contra essas autoridades. A ideia é que, com essa atualização da lei, não seja necessário debater uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da oposição que permitiria a qualquer cidadão solicitar o impeachment de ministros.
Reação a decisão do STF e tensão entre Poderes
A movimentação do Congresso é uma resposta à decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes, que declarou parte da Lei do Impeachment inconstitucional. O magistrado proibiu que cidadãos comuns protocolassem pedidos de impeachment de ministros no Senado, atribuindo essa competência exclusivamente ao procurador-geral da República (PGR).
Além disso, Gilmar Mendes elevou o quórum necessário para aprovar o afastamento de um ministro. Pela lei anterior, bastava a maioria simples dos votantes. Agora, o ministro equiparou o processo ao do presidente da República, exigindo o voto favorável de dois terços do Senado, ou seja, 54 dos 81 senadores.
Em defesa de sua decisão, Gilmar Mendes afirmou que a medida foi necessária devido ao volume de pedidos de impeachment, alguns com motivação política. "Com tantos pedidos de impeachment, com as pessoas anunciando que farão campanhas eleitorais para obter maioria no Senado para fazer o impeachment", justificou. O ministro Flávio Dino apoiou o colega, destacando que nunca houve tantas solicitações do tipo e citando o caso do ministro Alexandre de Moraes como o mais visado.
As falas, no entanto, foram criticadas por muitos congressistas. Apenas poucos, como o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), defenderam a decisão, alertando para um suposto plano da direita para intimidar o Supremo.
A tensão entre os Poderes foi agravada nesta quinta-feira (4) por declarações do presidente Lula durante reunião do "Conselhão". Ao criticar as emendas parlamentares impositivas, Lula afirmou que o Congresso "sequestrou 50% do Orçamento da União", o que gerou desconforto entre deputados e senadores da base aliada. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, questionou publicamente a fala, ressaltando seu trabalho para aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) conforme desejava o governo.
Dentro do Planalto, avalia-se que o debate sobre o impeachment de ministros pode tirar o foco da sucessão no STF e permitir um realinhamento da relação com o Senado. Há quem defenda um gesto de solidariedade de Lula a Alcolumbre para restabelecer a comunicação, interrompida após a indicação de Jorge Messias para uma vaga no Supremo, em detrimento de Pacheco. Um sinal nessa direção pode ser a viagem do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, ao Amapá nesta sexta-feira (5) junto com Alcolumbre.