O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), reconheceu publicamente que a cassação do mandato do ex-deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) foi conduzida por uma decisão da Mesa Diretora da Casa. O objetivo declarado foi evitar um novo embate institucional com o Supremo Tribunal Federal (STF), que já havia condenado Ramagem à perda do mandato.
Estratégia para evitar conflito com o Judiciário
Em entrevista coletiva na sexta-feira, 19 de dezembro, Motta detalhou a mudança de postura. Inicialmente, ele defendia que a palavra final sobre cassações deveria ser do plenário da Câmara, e não do Judiciário. No entanto, após o imbróglio gerado pela tentativa de cassação da deputada Carla Zambelli (PL-SP) – também condenada pelo STF –, a estratégia foi alterada.
"A questão do Ramagem, que estava prevista para ir ao plenário, por decisão dos líderes e dos membros da Mesa, e para evitar um novo episódio de conflito, de estresse institucional, houve uma decisão de decidir isso pela Mesa", explicou o presidente da Câmara.
Decisões diferentes para Zambelli e Ramagem
Motta afirmou que resolveu pautar as cassações de Ramagem, Zambelli, Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Glauber Braga (PSOL-RJ) ainda em 2025 para que o tema não se arrastasse até 2026. Contudo, os caminhos foram distintos. Enquanto os casos de Glauber Braga (convertido em suspensão) e Carla Zambelli foram votados no plenário, os de Ramagem e Eduardo Bolsonaro foram decididos pela Mesa Diretora.
No caso de Eduardo Bolsonaro, a justificativa foi o excesso de faltas permitidas pela Constituição, já que o deputado está nos Estados Unidos desde março. Para Ramagem, a Mesa usou como base faltas futuras, pois o ex-diretor da Abin, condenado a regime fechado por participação em atos golpistas, fugiu para os EUA e tem um mandado de prisão em aberto.
Questionado sobre a aparente incoerência entre tratar Zambelli no plenário e Ramagem na Mesa, Motta não deu esclarecimentos diretos. Limitou-se a dizer: "Ramagem está condenado a um regime fechado. Ele está no exterior por vontade própria. Se ele decidir ficar no exterior, não vai cumprir o mandato. Se voltar ao Brasil, também não vai cumprir o mandato, porque ele vai estar cumprindo a pena".
Firmeza contra ocupação da cadeira e tratamento a amotinados
Um momento de tensão na entrevista ocorreu quando Motta comentou o episódio em que o deputado suspenso Glauber Braga ocupou sua cadeira em protesto, sendo retirado à força pela polícia legislativa. Ele bateu na mesa e foi enfático: "Que se respeite a presidência da Câmara dos Deputados. A cadeira do presidente não pode ser ocupada da maneira que for".
Ele justificou a ação física diferente da adotada durante o motim bolsonarista de agosto, que ocupou o plenário por mais de 30 horas. "Eu não ia para o confronto físico [no caso do motim]. Para se evitar que isso vire recorrente, no caso do Glauber eu tomei outra decisão, de não deixar crescer o motim e retirar fisicamente", disse, alertando que agirá da mesma forma se novos casos ocorrerem.
Motta também expressou a expectativa de que o Conselho de Ética da Casa tenha um caráter pedagógico ao punir os deputados envolvidos no motim, processo que só será concluído em 2026.
Contexto das cassações e o caso Zambelli
A situação de Carla Zambelli ilustra a pressão do STF sobre a Câmara. Após o plenário salvar seu mandato, o Supremo determinou que a Casa declarasse a perda do mandato da deputada, que está presa na Itália aguardando decisão sobre extradição. A solução política encontrada por Motta foi aceitar a renúncia de Zambelli, sacramentada no domingo, 14 de dezembro.
As declarações de Hugo Motta evidenciam o delicado equilíbrio de poder entre o Legislativo e o Judiciário, especialmente em temas sensíveis como a perda de mandato de parlamentares condenados. A opção pela via da Mesa Diretora no caso Ramagem mostra uma tentativa de cumprir decisões judiciais sem submeter o tema a um voto plenário que poderia reacender o conflito com a Suprema Corte.