O governo brasileiro mantém a expectativa de que o histórico acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE) seja finalmente assinado no próximo sábado, 20 de julho. O ato está previsto para ocorrer durante a 67ª Cúpula do Mercosul e Estados Associados, que será realizada em Foz do Iguaçu, no Paraná. No entanto, autoridades brasileiras demonstram apreensão em relação às cláusulas de salvaguarda que o bloco europeu pretende incluir.
Preocupações e Cenário da Assinatura
A secretária de América Latina e Caribe do Ministério das Relações Exteriores, Gisela Padovan, confirmou a expectativa de assinatura, mas destacou os pontos sensíveis. "Nossa expectativa é de assinar o acordo no sábado, mas, de fato, as salvaguardas são motivo de preocupação", afirmou ela em coletiva de imprensa na segunda-feira, 15 de julho. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, deve participar do encontro de chefes de Estado, dando ainda mais peso ao evento.
Além do acordo principal, a agenda da cúpula é carregada. No dia 19, véspera do encontro presidencial, ministros da área econômica dos países do Mercosul se reunirão para tratar de temas internos e preparativos. Entre os assuntos em pauta estão a expansão do bloco e questões de interesse comum, como os desafios impostos pelas mudanças climáticas.
Expansão do Mercosul e Outras Negociações
O Brasil está ativamente trabalhando para acelerar a entrada da Bolívia como Estado Parte pleno do Mercosul. Gisela Padovan revelou que "diversas reuniões têm sido feitas com esse objetivo, para que [a Bolívia] entre rápido [no bloco]". Ela ponderou, porém, que é necessário verificar o cumprimento de alguns pré-requisitos pelo país andino.
O bloco também busca estreitar laços com nações da América Central e do Caribe. As conversas com a República Dominicana estão em estágio avançado, segundo a secretária. Outro ponto importante da política interna do Mercosul é a integração dos setores automotivo e açucareiro na Tarifa Externa Comum (TEC), com o objetivo de superar as atuais exceções e acordos bilaterais, como o existente entre Brasil e Argentina.
Esta edição da cúpula também contará com um espaço para a sociedade civil. "Será uma oportunidade para que entidades da sociedade civil manifestem suas questões diretamente com os chefes de Estado", explicou Padovan sobre a cúpula social que ocorrerá paralelamente.
O Que São as Salvaguardas e Porque São Polêmicas
As salvaguardas mencionadas com preocupação pela diplomacia brasileira são mecanismos de proteção que o Parlamento Europeu quer instituir. Seu objetivo declarado é proteger o mercado agropecuário europeu da concorrência de produtos do Mercosul, que em muitos casos chegam com custos mais baixos.
A França, maior produtor de carne bovina da UE, tem sido o principal obstáculo ao acordo. Representantes franceses já chegaram a classificar o tratado como "inaceitável", argumentando que ele não consideraria adequadamente exigências ambientais na produção agrícola e industrial sul-americana. Agricultores europeus também protestam, temendo que o acordo abra as portas para importações baratas de commodities, especialmente carne bovina, que não atendam aos seus padrões de segurança alimentar e ecológicos.
Do lado do Mercosul, há o receio de que essas exigências por práticas sustentáveis possam ser usadas como barreiras comerciais disfarçadas, limitando o acesso de produtos aos mercado de 720 milhões de pessoas e PIB de US$ 22 trilhões que representa a União Europeia.
Longo Caminho até a Ratificação
As negociações deste acordo começaram há 26 anos. Em dezembro passado, após um quarto de século de conversas, UE e Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) anunciaram a conclusão do texto negociado. Dois documentos serão firmados: um acordo comercial de natureza provisória e o texto completo e definitivo.
Em setembro, a Comissão Europeia submeteu formalmente os textos ao Parlamento Europeu e aos 27 estados-membros. O caminho para a vigência total, porém, ainda é longo. O Parlamento Europeu precisa aprová-lo com votos favoráveis de 50% dos deputados mais um voto. Depois, pelo menos 15 dos 27 países, representando 65% da população da UE, devem ratificá-lo internamente – um processo que pode levar anos.
Os países do Mercosul também precisarão submeter o acordo final à aprovação de seus parlamentos nacionais. A entrada em vigor do tratado completo será individual para cada nação, ou seja, não é necessário aguardar que todos os quatro membros ratifiquem simultaneamente. Quando isso acontecer, o acordo completo substituirá o provisório.