O Ministério Público do Estado de São Paulo emitiu um despacho, nesta segunda-feira (1º), apontando uma série de fragilidades no novo projeto do reservatório RP-4, planejado para a Praça Ralph Stettinger, em Campinas. A promotora Luciana de Carvalho, da 12ª Promotoria de Justiça Cível, solicitou esclarecimentos urgentes à Prefeitura de Campinas e à Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), dando um prazo de 15 dias para resposta.
Pontos críticos levantados pelo MP
O projeto, que integra o plano municipal de macrodrenagem, tem como objetivo principal reduzir os alagamentos na região do Córrego Proença e da Avenida Norte-Sul, áreas historicamente castigadas pelas chuvas na cidade. No entanto, a análise técnica do Centro de Apoio Operacional à Execução (Caex) do MP identificou problemas graves.
Entre as principais preocupações estão o risco de contaminação do solo e da água subterrânea, devido à profunda escavação de 24 metros necessária para a construção do reservatório subterrâneo. Os técnicos recomendam uma nova manifestação da Cetesb sobre esse tópico específico.
Controvérsia sobre o corte de árvores e estudos ambientais
Um dos pontos mais sensíveis continua sendo o impacto na arborização. O projeto original, amplamente contestado, previa a supressão de 348 árvores. A versão revisada apresentada pela prefeitura reduziu esse número para 48.
Porém, o Ministério Público alerta que o número real de árvores a serem cortadas pode ser maior e levanta a possibilidade de existir uma nascente próxima ao local da obra, uma situação que exigiria avaliação. Além disso, o MP destaca que o município não apresentou um novo Termo de Compromisso Ambiental nem um plano de compensação para as Áreas de Preservação Permanente do Córrego Proença, itens considerados essenciais.
Eficácia da obra e necessidade de soluções complementares
Os peritos do MP questionam a capacidade do reservatório de resolver isoladamente o problema das enchentes. O relatório técnico afirma que, durante chuvas intensas, um grande volume de águas pluviais vem dos bairros Cambuí e Jardim Planalto, e que a construção do reservatório na Praça Ralph Stettinger "por si só, não resolverá esse aporte adicional".
Como recomendação, os técnicos defendem a adoção imediata de medidas complementares que priorizem as Soluções Baseadas na Natureza (SBN), como jardins de chuva e pavimentos permeáveis, que teriam efeito mais duradouro.
Posicionamento da Prefeitura de Campinas
Em nota oficial, a Secretaria Municipal de Infraestrutura informou que recebeu o ofício do MP no dia 3 de dezembro e que irá responder dentro do prazo estipulado, após uma "análise criteriosa e aprofundada dos pontos abordados". A administração ressaltou que todos os projetos do plano de macrodrenagem foram desenvolvidos por uma empresa de notório saber e que estudos técnicos prévios foram realizados.
A prefeitura justifica a urgência da obra lembrando que a região registrou três vítimas fatais em decorrência de enxurradas, além de significativos impactos socioeconômicos causados pelos alagamentos recorrentes.
Contexto e histórico do projeto
O reservatório RP-4, com capacidade estimada de 90 milhões de litros de água, é a terceira grande obra prevista no plano antienchente de Campinas. O projeto já enfrenta resistência desde 2023, quando o MP instaurou um inquérito civil para apurar seus impactos.
Em março de 2025, o Conselho Municipal de Meio Ambiente (Condema) emitiu um parecer contrário, pedindo a suspensão do projeto. Entidades da sociedade civil, como a ONG Resgate Cambuí, também se posicionaram contra, argumentando que a remoção de centenas de árvores é um retrocesso ambiental em um cenário de mudanças climáticas.
O imbróglio entre o MP e a prefeitura se intensificou no fim de setembro, quando a promotoria criticou a administração municipal por anunciar a conclusão do projeto básico e a abertura da licitação em 90 dias, o que, segundo o órgão, descumpria um acordo feito em audiência pública para aguardar a análise técnica completa.