Derrota ambiental no Congresso uma semana após COP30
O Congresso Nacional aprovou nesta quinta-feira, 27 de novembro de 2025, a derrubada de 56 dos 63 vetos presidenciais relacionados à Lei de Licenciamento Ambiental. O resultado representa uma significativa derrota para o governo Lula e para ambientalistas, ocorrendo apenas uma semana após o encerramento da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), realizada em Belém, no Pará.
A sessão parlamentar aconteceu de forma semipresencial e com baixa participação de deputados e senadores, tendo sido marcada por um cenário de esvaziamento onde assessores parlamentares superaram em número os próprios legisladores. Além dos 56 vetos derrubados, outros sete tiveram suas análises suspensas temporariamente em um processo conhecido como sobrestamento.
Impactos diretos na legislação ambiental
Entre as mudanças mais criticadas por especialistas está a derrubada do veto que impedia o licenciamento simplificado para projetos de médio potencial poluidor através da Licença por Adesão e Compromisso (LAC). Esta modalidade inclui empreendimentos similares às barragens de Brumadinho e Mariana, que romperam e se tornaram dois dos maiores desastres ambientais da história do Brasil.
Outro ponto sensível foi o adiamento da análise sobre o Licenciamento Ambiental Especializado (LAE) em fase única, uma proposta que havia sido mantida pelo governo, mas sem a possibilidade de um processo monofásico.
Letícia Camargo, consultora do Painel Mar e integrante do Observatório do Clima, expressou profunda preocupação com as consequências da decisão: "Isso vai trazer insegurança territorial para o país e problemas gravíssimos de saúde pública, de poluição e desmatamento. Para povos e comunidades tradicionais também é gravíssimo, pois temos visto eles serem atropelados por grandes empreendimentos".
Consequências para comunidades e setor pesqueiro
Henrique Kefalás, coordenador executivo do Instituto Linha D'Água, alertou para os impactos imediatos na pesca artesanal e na sobrevivência de comunidades costeiras. "Licenciamento para abertura de terminais portuários, novas frentes de exploração de petróleo e iniciativas ainda desconhecidas sendo regidas por uma legislação fragilizada", afirmou.
Kefalás destacou ainda a necessidade de aprimorar o processo de licenciamento, mas não na lógica atual de flexibilização: "É preciso aprimorar o processo de licenciamento, mas não nessa lógica de flexibilizar, torná-lo autodeclaratório; confiando em empresas que não têm demonstrado compromisso ético e socioambiental".
Segundo dados do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), quase 2 milhões de pessoas dependem da atividade pesqueira no Brasil, tornando estas comunidades particularmente vulneráveis às mudanças na legislação ambiental.
Contexto político e articulações
A sessão ocorreu em um momento de tensão entre o Planalto e o Congresso. O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), tentou adiar pela segunda vez a análise dos vetos presidenciais, mas encontrou resistência do presidente do parlamento, senador Davi Alcolumbre (União-AP).
A relação entre Alcolumbre e o governo Lula já estava estremecida após frustrações políticas envolvendo a indicação para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). O senador articulava a indicação de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para a cadeira deixada por Luís Roberto Barroso, mas viu Lula indicar o atual Advogado-geral da União, Jorge Messias.
Apesar das tensões anteriores, o clima durante a sessão foi de aparente harmonia. Randolfe agradeceu a Alcolumbre pelos acordos construídos, e o colega retribuiu os elogios, incluindo agradecimentos à senadora Teresa Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura na gestão de Jair Bolsonaro e principal articuladora do projeto de licenciamento.
Na véspera da votação, grupos ambientalistas tentaram mobilizar a opinião pública contra a derrubada dos vetos, realizando um ato na manhã de quarta-feira, 26 de novembro. No entanto, o clima entre líderes governistas já era de pessimismo, após reunião na Secretaria de Relações Institucionais onde foram alertados sobre a falta de acordo com a oposição e a chance quase nula de manutenção da maioria dos vetos presidenciais.