PF investiga manobra de Cláudio Castro para proteger aliado do Comando Vermelho
PF investiga manobra de Castro para proteger aliado do CV

A Polícia Federal (PF) identificou um despacho do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), como a primeira evidência direta de uma possível atuação do chefe do Executivo estadual para proteger interesses do Comando Vermelho (CV) dentro do Palácio Guanabara. A investigação apura os tentáculos da facção criminosa no Legislativo fluminense.

Manobra para evitar votação na Alerj

O ato governamental, assinado por Castro em caráter de urgência, forçou a publicação de uma edição extraordinária do Diário Oficial do Estado no dia 3 de setembro de 2024. A medida ocorreu na mesma tarde em que o então deputado estadual TH Jóias (Thiego Raimundo dos Santos Silva) foi preso pela PF, suspeito de lavagem de dinheiro, compra de armas e drones e de manter relações pessoais com chefes do CV.

O despacho determinava a exoneração do então secretário estadual de Esporte e Lazer, Rafael Picciani (MDB), filho e principal herdeiro político do falecido Jorge Picciani. Com a saída do secretariado, Picciani retomaria seu mandato como deputado estadual, substituindo automaticamente TH Jóias, que era seu segundo suplente.

Segundo fontes da investigação, o objetivo da manobra era evitar que a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) tivesse que votar pela manutenção ou relaxamento da prisão de TH Jóias, como determinam as regras estaduais quando um parlamentar é preso. Com a perda do mandato, não haveria mais motivo para a Casa deliberar sobre o caso.

Estratégia para controlar danos e manter votos

Na decisão que determinou a prisão do atual presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar, na quarta-feira, 3 de dezembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes analisou o episódio. O magistrado classificou o despacho de Castro como uma "célere manobra regimental" com efeito imediato de controle de danos, buscando desvincular a imagem da Alerj do deputado preso.

No entanto, Moraes aponta um segundo objetivo mais profundo. A estratégia, na visão da investigação, seria manter o vínculo de agentes políticos com o Comando Vermelho. A facção, que controla extensas áreas do estado, seria capaz de mobilizar milhões de votos, um ativo considerado crucial para as eleições de 2026.

O ministro destacou que TH Jóias era um aliado político conhecido do governador e presença constante em eventos dos Poderes Executivo e Legislativo, fato documentado em várias fotos divulgadas na internet.

Determinações do STF e desdobramentos

Alexandre de Moraes determinou ao governo do Rio que forneça todos os dados de acesso aos sistemas online onde tramitaram os documentos da exoneração de Picciani. A ordem inclui horários, usuários responsáveis e logs de acesso.

O ministro também requisitou à Imprensa Oficial do Estado as informações sobre o pedido de criação da edição extraordinária do Diário Oficial em 3 de setembro. As medidas buscam reconstituir o timing e a autoria da manobra considerada suspeita.

No dia da movimentação, o próprio governador Cláudio Castro foi às redes sociais para anunciar a substituição. "Por minha determinação, o deputado estadual Rafael Picciani está retomando seu mandato na Assembleia Legislativa. Ele substitui o deputado estadual TH Joias, preso hoje", escreveu Castro. A postagem, hoje, é um dos elementos analisados pela PF.

O caso expõe o risco de a Alerj ficar refém de um jogo político perigoso. Manter a prisão de um parlamentar com ligações diretas com o tráfico seria uma medida impopular. Por outro lado, soltá-lo poderia significar romper pontes com a facção que controla territórios e, potencialmente, bancos de votos. A investigação da PF, agora com aval do STF, tenta desvendar se a manobra foi apenas um contorno regimental ou parte de um esquema maior de proteção ao crime organizado.